Guaranis ocupam sítio histórico em São Paulo para cobrar demarcação de terras
Cerca de 50 índios guaranis ocuparam, por volta das 15h30 de hoje (16), o Pátio do Colégio, marco da fundação da cidade de São Paulo, para reivindicar a demarcação de terras reconhecidas pela Fundação Nacional do Índio (Funai) como tradicionalmente indígenas dentro do município. Eles pretendem chamar a atenção da sociedade e pressionar o Ministério da Justiça para assinatura de uma portaria que regulariza a posse da terra de acordo com a área definida pela Funai. Amanhã (17), no largo em frente ao prédio do Pátio do Colégio, às 16h, o grupo lançará a campanha “Assina logo, Cardozo”, dirigida ao ministro da pasta, José Eduardo Cardozo.
“É uma forma de gritar para o ministro e para o mundo que a gente só quer um espacinho daquilo que um dia já foi nosso. A gente não está pedindo São Paulo inteira de volta, não está pedindo o Pátio do Colégio, a gente só quer a demarcação desses espaços para sobreviver culturalmente, espiritualmente e fisicamente”, explicou a professora Jera Guarani, liderança indígena. Os guaranis da capital paulista somam aproximadamente 2 mil pessoas. Participam da ocupação, índios das terras indígenas Jaraguá, na zona oeste, e Tenondé Porã, no extremo sul da cidade.
Desde que entraram no local, os índios estão tocando e dançando músicas tradicionais da cultura indígena. Eles estão no fundo do prédio e, até o momento, os funcionários da instituição apenas acompanham a movimentação do grupo. O local é um complexo arqueológico, que tem um café e um museu. No local, foi rezada a primeira missa e erguida a primeira construção da atual cidade de São Paulo, por obra de jesuítas como Manuel da Nóbrega e José Anchieta, enviados para a catequização de indios no Planalto Paulista.
De acordo com os indígenas, o reconhecimento de três áreas de ocupação tradicional do povo guarani em São Paulo ocorreu na década de 1980, mas a extensão das áreas sempre foi insuficiente para a reprodução física e cultural das comunidades. “Somos um povo tradicional, que vive em equilíbrio com a natureza, e faz algum tempo que a gente está prejudicado por conta da falta de território para plantar com as crianças, caçar, ensinar o respeito pela natureza”, apontou Jera. Ela destaca que crianças com idade entre 11 e 12 anos, por exemplo, nunca participaram da colheita de milho e de outras sementes tradicionais.
Um dos territórios, a Terra Indígena Guarani da Barragem, fica no extremo sul de São Paulo, na região de Parelheiros. Ela é formada por uma área de 26,3 hectares (ha). Na mesma região, está a Guarani do Krukutu, com 25,9 ha. Na zona oeste, fica o Território Indígena do Jaraguá, com 1,7 ha, o qual, segundo os índios, é a menor área reconhecida do país. Em 2012, a Funai aprovou o relatório que descreve os reais limites da ocupação tradicional no sul do município, que segundo o documento alcança 15.569 ha. Esse documento também reconhece uma nova área indígena, a Tenondé Porã. Um hectare tem 10 mil metros quadrados, o tamanho aproximado de um campo de futebol.
Em 2013, a Funai aprovou o relatório da ocupação guarani na região do Pico do Jaraguá, reconhecendo a Terra Indígena Jaraguá, com cerca de 532 ha, também no território da capital paulista. Os documentos emitidos pela Funai, no entanto, precisam da portaria do Ministro da Justiça para que as áreas sejam demarcadas. “Nós achamos que ele está sendo pressionado pela bancada ruralista. Os indígenas no Brasil são vistos como um estorvo, um atraso para o progresso”, avaliou a liderança. A campanha guarani vai enviar ao ministro José Eduardo Cardozo, por correio, caneta decoradas com artesanato indígena e alguns instrumentos próprios da cultura indígena, como o cachimbo.
Sem o término do processo de demarcação, os índios ainda sofrem ameaças de despejo, além das dificuldades para manter a tradição indígenas nas atuais áreas. É o caso da Aldeia Tekoa Pyau, no Pico do Jaraguá, onde foi decidida em primeira instância uma reintegração de posse para retirar os índios do local. “Estamos aqui para lutar pela nossa cultura, pelas nossas crianças e pela preservação do nosso modo de vida. Ainda hoje, têm pessoas que não falam português nas nossas aldeias, mesmo depois da invasão de europeus e depois de passar por tantas histórias de ataques”, defendeu Jera.