Lei Áurea não é motivo de comemoração, afirmam movimento negro e Seppir
A Lei Áurea, que aboliu oficialmente a escravidão no Brasil, completa neste 13 de maio 126 anos. A data, no entanto, não é comemorada pelo movimento negro. A razão é o tratamento dispensado aos que se tornaram ex-escravos no país. “Naquele momento, faltou criar as condições para que a população negra pudesse ter um tipo de inserção mais digna na sociedade”, disse a ministra da Secretaria de Políticas de Promoção da Igualdade Racial (Seppir), Luiza Bairros, à Agência Brasil.
Após o fim da escravidão, de acordo com o sociólogo Florestan Fernandes (1920-1995), em sua obra A Integração do Negro na Sociedade de Classes, de 1964, as classes dominantes não contribuíram para a inserção dos ex-escravos no novo formato de trabalho.
“Os senhores foram eximidos da responsabilidade pela manutenção e segurança dos libertos, sem que o Estado, a Igreja ou qualquer outra instituição assumisse encargos especiais, que tivessem por objeto prepará-los para o novo regime de organização da vida e do trabalho”, diz o texto.
De acordo com a ministra da Seppir, houve, então, um debate sobre a necessidade de prover algum recurso à população recém-saída da condição de escrava. Esse recurso, que seria o acesso à terra, importante para que as famílias iniciassem uma nova vida, não foi concedido aos negros. Mesmo o já precário espaço no mercado de trabalho que era ocupado por essa população passou a ser destinado a trabalhadores brancos ou estrangeiros, conforme Luiza Bairros.
Integrante da União de Negros pela Igualdade (Unegro), Alexandre Braga explica que “O 13 de maio entrou para o calendário da história do país, então não tem como negar o fato. Agora, para o movimento negro, essa data é algo a ser reelaborado, porque houve uma abolição formal, mas os negros continuaram excluídos do processo social”.
“Essa data é, desde o início dos anos 80, considerada pelo movimento negro como um dia nacional de luta contra o racismo. Exatamente para chamar atenção da sociedade para mostrar que a abolição legal da escravidão não garantiu condições reais de participação na sociedade para a população negra no Brasil”, completou a ministra.
Ela defende, porém, que as mudanças nesse cenário de exclusão e discriminação estão acontecendo. “Nos últimos anos, o governo adotou um conjuntos de políticas sociais que, aliadas à política de valorização do salário mínimo, criou condições de aumento da renda na população negra”.
Apesar dessas políticas, tanto a ministra quanto Braga entendem que ainda há muito por fazer.
O representante da Unegro cita algumas das expressões do racismo e da desigualdade, no país: “No Congresso, menos de 9% dos parlamentares são negros, enquanto que a população que se declara negra, no Brasil, chega a 51%. Estamos vendo também manifestações de racismo nos esportes, principalmente no futebol. Ainda temos muito a caminhar”.
“Ainda estamos tentando recuperar a forma traumática como essa abolição aconteceu, deixando a população negra à sua própria sorte. Como os negros partiram de um patamar muito baixo, teremos que acelerar esse processo com ações afirmativas, para que possamos sentir uma diminuição mais significativa das desigualdades”, explicou Bairros.