Brasília e SP: atos em defesa de direitos marcam o Dia Internacional da Mulher
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Manifestantes promoveram atos em Brasília e em São Paulo para marcar o Dia Internacional da Mulher e em defesa de direitos.
Apesar da chuva forte, milhares de mulheres que foram à Esplanada dos Ministérios protestar pela igualdade de gênero, pela democracia e por direitos sociais, políticos e reprodutivos. Após concentração no pátio do Museu Nacional da República, elas seguiram em passeata até a Alameda dos Estados, em frente ao Congresso Nacional.
A organização do ato Mulheres Unificadas do DF e Entorno estima que cerca de 5 mil pessoas, maioria mulheres, participou do ato, organizado por mais de 60 entidades ligadas à luta feminina.
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Mulheres fazem atos em defesa dos direitos sociais, políticos e reprodutivos na Esplanada dos Ministérios
Em nome da Marcha Mundial das Mulheres, uma das organizadoras do protesto, Thaísa Magalhães comemorou que pelo segundo ano seguido conseguiram unificar “todos os movimentos de mulheres feministas e de esquerda” para defender as pautas do movimento feminista não só no dia 8 de março, mas o ano inteiro.
“Temos uma preocupação muito grande com o avançar da falta de democracia no país, que afeta especialmente as mulheres, pelo fato de elas estarem na ponta mais fraca da economia e do mercado de trabalho, muitas em regime de trabalho sem carteira assinada, por exemplo. A perda de direitos trabalhistas, como já vimos, e projetos como a proposta de reforma da Previdência, fazem com que elas sejam as que mais perdem”, disse.
Thaísa também falou da importância do combate a violência contra a mulher. “Estamos assistindo assustadas aqui no DF o crescimento do número de estupros e de violência contra as mulheres e ao mesmo tempo uma diminuição no investimento dos aparelhos de acolhimento das mulheres vítimas de violência”.
A participação das mulheres na política também foi debatida no ato. A pesquisadora Sheila Campos, da Rede de Novas Pesquisas sobre Feminismo e Política da Universidade de Brasília e do movimento Partida Feminista, destacou que apesar de serem mais de metade da população brasileira, as mulheres estão longe de ocupar metade dos espaços de poder.
“Mulheres precisam se incentivar e se apoiar para se candidatar e se eleger para cargos públicos. Meninas e adolescentes precisam ser incentivadas a usar a sua voz, seja como representantes nas escolas, no bairro, para que falem nos espaços públicos. É preciso acabar com o mito de que mulheres não gostam de política e que não devem ocupar os espaços públicos porque são violentos e elas não sabem se defender. Nós temos todas as capacidades, todas. O século 21 é prova disso.”, disse.
Para ela, as mulheres pagam um preço alto por não terem representatividade política. “Afeta em termos de saúde, por exemplo, como é o caso dos direitos reprodutivos. Você tem a votação de uma Emenda à Constituição, como a PEC 181, que trata de temas como licença-maternidade para mães de crianças prematuras, feita por homens, que vão decidir sozinhos sobre os nossos corpos. Obrigar uma mulher a levar adiante uma gestação de uma criança acéfala ou fruto de estupro é uma das maiores violências que se pode cometer. E os homens que estão lá decidindo isso, não estão pensando nisso.”
Em nome da Frente de Mulheres Negras do DF e Entorno, a ativista Joseanes dos Santos ressaltou que os números oficiais mostram uma realidade muito pior para as mulheres negras no Brasil: ocupam os piores lugares da sociedade e enfrentam maior dificuldade para acessar cidadania, moradia, emprego e renda.
“Nos últimos dez anos o número de morte de mulheres negras aumentou 54%, enquanto o número de mortes de mulheres brancas caiu 9%. O que é isso? Racismo. Nós também ganhamos 51% a menos que as brancas no mercado de trabalho e a mortalidade materna entre negras é 68% maior que entre as brancas. A cor diferencia os dados.”, disse.
Para ela, é fundamental que sejam feitas políticas públicas específicas para essas mulheres. “Vivemos em situação de vulnerabilidade. Precisamos enfrentar condições mais difíceis para estudar e trabalhar e se eleger. Ao mesmo tempo, não existe nenhuma política pública do governo brasileiro, nem nunca existiu, voltada para as negras brasileiras.”
Joseanes também falou sobre o que classifica como “violência institucionalizada” contra comunidades de periferia. “Nós, negros, somos maioria nas periferias e favelas e sempre vivemos sob intervenção militar.”
São Paulo
Em São Paulo, o ato ocorreu na Avenida Paulista. A mobilização começou às 16h na Praça Oswaldo Cruz e foi encerrada com uma batucada de mulheres em frente ao escritório da Presidência da República, na mesma avenida, às 20h30. No ato, grupos protestaram em defesa da democracia e contra a violência de gênero e as reformas da Previdência e trabalhista.
Os organizadores informaram que o ato reuniu 50 mil pessoas. A Polícia Militar não estimou o número de participantes.
A estudante Rafaela Carvalho, integrante do Movimento Olga Benário, disse que que o ato tinha como objetivo alertar para a necessidade de melhoria "da vida das mulheres, sobretudo, as mais pobres”.
“Lutamos contra problemas como a falta de creche. Se a mulher não tem onde deixar os filhos, não tem como trabalhar e, com isso, muitas vezes tem que se sujeitar à uma situação de violência. Enfrentamos também muitos casos de meninas mais jovens que precisam lidar com o assédio, que começa com o fiufiu. A gente tenta, com o nosso trabalho, alcançar essas mulheres”, ressaltou Rafaela.
Da aldeia Guarani, localizada no pico do Jaraguá, a indígena Sônia Ará participou do ato e destacou os desafios de desconstrução do machismo nas comunidades tradicionais. "No começo de tudo, as mulheres eram mais caladas. Hoje, a mulher tem empoderamento de sair e falar de sua comunidade”, relatou. Ela conta que a aldeia que faz parte conta com uma organização de mulheres e que isso foi mudando a posição feminina. “Deixei marido e filho em casa. Disse: 'Estou indo pra marcha'. E a gente conquistou essa liberdade. Nós fazemos parte da vida dos homens, mas eles não são nossos donos”, afirmou.
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Mulheres protestam contra violência e em defesa da democracia no Dia Internacional da Mulher, na Avenida Paulista
A ativista Amelinha Teles, que resistiu à ditadura militar, participa todos os anos dos eventos do dia 8 de março em São Paulo. “Este ato em 2018 tem uma importância histórica porque é demonstração da força feminista contra os retrocessos e perdas. É uma manifestação que também é celebração da luta histórica. É mostrar que estamos aqui resistindo. Nós já recebemos salários menores, temos menos visibilidade na política, somos o alvo da violência de gênero, racista”, declarou.
Representante do Movimento dos Trabalhadores Sem Teto (MTST), Cláudia Garcez destacou que sua participação no ato representava a experiência de auto-organização feminina em uma ocupação na zona leste de São Paulo. “Na ocupação Tereza de Benguela, a gente se organiza para o empoderamento das mulheres com os eixos saúde, geração de renda, cultura e formação política”, ressaltou. No eixo geração de renda, por exemplo, as mulheres produzem joias ecológicas com cápsulas de máquina de café expresso. “O machismo nos afeta de forma estrutural e a gente está lutando para desconstruir aos poucos”, disse.
Sônia Coelho, da Marcha Mundial de Mulheres, uma das 90 entidades que organizaram o movimento, destacou que a desigualdade afeta sobretudo a vida das mulheres. "Nós ainda somos as maiores responsáveis pelo trabalho doméstico. Essas reformas [trabalhista e da Previdência] aprofundam ainda mais a desigualdade entre homens e mulheres na nossa sociedade”, afirmou.
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