Ação educativa oportuniza trocas de informações entre Brasil e África
A assimilação, por parte da sociedade, da importância dos princípios democráticos pode ser mais importante do que a consolidação de uma democracia institucionalizada. A avaliação é do pesquisador Serge Katembera, que participa nesta semana da atividade formativa "Cultivar Direitos: saberes e práticas para temas emergentes", promovida na sede da Organização Não Governamental (ONG) Ação Educativa, em São Paulo.
A programação teve início nesta terça-feira (25) e se estende até a próxima sexta-feira (28). Foram convidados representantes do Ministério da Justiça e dos Direitos Humanos da Angola.
Um dos objetivos do intercâmbio é facilitar o compartilhamento de percursos e referências entre países do continente africano e o Brasil em esferas como a mudança do clima, igualdade de gênero e tecnologia.
Katembera, que é franco-congolês e realizou parte de sua trajetória acadêmica no Brasil, percebe que há, atualmente, uma arapuca relevante, por sua capacidade de capturar e estrangular mecanismos que garantem a manutenção de um regime democrático em um país. Para ele, o problema surge quando se pressupõe que a democracia é um interesse da sociedade civil como um todo.
"É perigoso isso, porque dentro dela há grupos antidemocráticos", explica o sociólogo, que se especializou na área de democratização e consolidação da democracia na África francófona.
O pesquisador é um dos especialistas que integram as rodas de conversa, que teve a presença de outros participantes, como o advogado de direito internacional Jefferson Nascimento e a ex-secretária executiva do Ministério das Mulheres, da Igualdade Racial, da Juventude e dos Direitos Humanos Élida Lauris.
"O que a gente está observando é exatamente uma regressão da democratização da sociedade", resume Katembera.
Uma das histórias lembradas por ele, que hoje aprofunda seus estudos sobre o impacto das novas tecnologias da informação e do ciberativismo, foi a vez em que estava com dois amigos, na República Democrática do Congo, e foram abordados por agentes de segurança pública. Segundo Katembera, o que determinou seu destino foi a rápida opção por se comunicar com os agentes em uma língua da sua etnia, considerada superior por quem estava então no poder, em vez de falar a língua de seus amigos, pertencentes a outra.
Katembera relatou, ainda, aos participantes do curso ministrado na capital paulista, que também já foi parado por agentes em Senegal, porque tirava fotos diante de uma instituição militar. Segundo ele, isso exemplifica como em alguns países, até recentemente ou mesmo na atualidade, remanesce um clima de suspeita de tentativas de espionagem e, com isso, de hipervigilância.
"O grande fracasso é que a gente está indo no sentido contrário. Não só no Brasil, mas no mundo, nos Estados Unidos", afirma o acadêmico, que adota como uma de suas ferramentas de trabalho os relatórios produzidos pela Human Rights Measurement Initiative (https://humanrightsmeasurement.org/), que coleta, monitora e repercute indicadores de direitos humanos de 196 países.

