Analistas dizem que investigação de empresas impacta economia, mas é necessária
A confirmação de que a Odebrecht S/A está negociando acordos de leniência e delação premiada de seus executivos e funcionários com o Ministério Público Federal (MPF) é um dos fatos mais importantes da Operação Lava Jato, na avaliação de especialistas ouvidos pela Agência Brasil. Segundo os analistas, o envolvimento das maiores empreiteiras do país nas denúncias abala a economia, mas a investigação é necessária.
Para o secretário-geral e fundador da organização não governamental (ONG) Contas Abertas, Gil Castello Branco, as revelações resultantes da colaboração da Odebrecht tendem a ser “explosivas”. “A Odebrecht foi, durante alguns anos, a maior empresa do país em se considerando o Orçamento da União. É importante tanto pelo que realiza dentro como fora do Brasil.”
Na avaliação de Castello Branco, o retorno do país a um cenário político e econômico saudável passa pela punição “exemplar” das empresas cujo envolvimento em esquemas ilegais ficou comprovado. Segundo ele, é uma “falácia” responsabilizar a Operação Lava Jato pela paralisação da economia brasileira. “Diante de tudo que vimos acontecer, acho que essas empresas têm que ter uma punição rigorosa. É uma falácia dizer que o país vai parar se as empresas forem punidas”, disse.
Levantamento do Contas Abertas mostrou que, em 2015, de R$ 39,1 bilhões em investimentos da União, as empresas citadas na Lava Jato participaram com apenas R$ 1,3 bilhão, o equivalente a 3,4%.
Quando se fala apenas de investimentos em obras e instalações, que somaram R$ 10,6 bilhões, a participação das empreiteiras investigadas na operação aumenta, chegando a 12,5%. Castello Branco defende que as empresas acusadas no esquema de corrupção sejam declaradas inidôneas, o que as impediria de fechar novos contratos com o Poder Público. “Seria uma medida de purificação.”
A inidoneidade de uma empresa pode ser declarada tanto no âmbito administrativo quanto no jurídico. Para Castello Branco, a Controladoria-Geral da União (CGU), que negocia acordos de leniência com algumas das empresas investigadas na Lava Jato, deveria tomar a iniciativa de declarar a inidoneidade.
Segundo ele, isso abriria espaço para pequenas e médias empresas contratarem com o governo. “O mercado é fechado porque esse clube de empreiteiras corruptas não permitia que outras participassem. Isso seria um ganho em termo de preços menores e maior qualidade”, disse.
Leniência
Especialista em direito empresarial da Guerra Advogados, Luiz Guerra considera a decisão de colaboração da Odebrecht “bem-vinda”. Para ele, a busca por um acordo de leniência é a decisão mais acertada do ponto de vista de estratégia empresarial.
“Nós temos a delação dos executivos, e aí a responsabilidade é meramente penal, como também a colaboração que pode envolver a empresa. [A leniência] seria uma decisão extremamente inteligente, pois o maior nicho de mercado das empresas de grande porte é a administração pública. Ela tem que se recuperar financeiramente.”
Guerra lembra que o acordo de leniência é benéfico também como forma de barrar novos episódios de corrupção, já que exige medidas de compliance (conjunto de disciplinas no ambiente corporativo para fazer cumprir as normas legais e detectar e sanar eventuais desvios). “[A empresa] tem que cessar imediatamente a prática que vinha cometendo, estabelecer um código de ética, suspender esses atos lesivos. São condições do acordo de leniência. A CGU, o Cade [Conselho Administrativo de Defesa Econômica], com suas respectivas procuradorias, fiscalizam o cumprimento”, destacou.
O cientista político Márcio Malta, da Universidade Federal Fluminense, diz que o envolvimento das maiores empresas do país em desvios de verbas “prejudica” as relações entre o setor público e o privado. “Boa parte das empreiteiras participa de obras capitais, como da Copa do Mundo e do Minha Casa, Minha Vida. Atualmente elas estão com grandes problemas, não só de visibilidade, opinião pública, como também em termos de caixa.”
Malta destaca a profundidade das investigações e diz não visualizar um quadro de normalização em um futuro próximo. “Não foi qualquer executivo, não foi qualquer cargo de direção. Foram os donos das empresas, carregando inclusive o sobrenome. O ano de 2016 já acabou. Vamos começar a reorganizar a casa em 2017."