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Economia

IICA: países em desenvolvimento podem trocar experiências na área agrícola

O novo diretor-geral do Instituto Interamericano de Cooperação para a
Mariana Tokarnia – Enviada Especial*
Publicado em 16/01/2018 - 07:02
San José
O presidente do IICA, Manuel Otero - Jeffrey Arguedas-EFE
© Jeffrey Arguedas-EFE
O presidente do IICA, Manuel Otero - Jeffrey Arguedas-EFE

O presidente do IICA, Manuel Otero Jeffrey Arguedas/EFE

Os países da América Latina têm muitas coisas em comum, entre elas o destaque que a atividade agropecuária tem em sua economia. No Brasil, por exemplo, a boa safra do ano passado foi um dos fatores que levaram o país a encerrar o ano, pela primeira vez, com a inflação abaixo do limite da meta estipulada pelo Banco Central. Para o novo diretor-geral do Instituto Interamericano de Cooperação para a Agricultura (IICA), Manuel Otero, a troca entre os países pode contribuir para o desenvolvimento de todo o bloco.

Em entrevista exclusiva à Agência Brasil, Otero diz que, à frente do Instituto, vai incentivar as trocas e os projetos que envolvam vários países. “Hoje todos os temas são de natureza compartilhada. Quando se pensa em defesa agropecuária, quando se analiso o mapa de pragas e enfermidades, normalmente elas são compartilhadas entre os países. Então, é muito melhor ter um grande projeto supranacional, com componentes nacionais [ajustados à realidade de cada país], do que muitos projetos nacionais”.

O médico veterinário argentino Manuel Otero tomou posse nessa segunda-feira (15). Ele trabalha no IICA há 25 anos e, nesse tempo, chegou a ser representante do instituto no Brasil, de 2010 a 2015. O IICA é vinculado à Organização dos Estados Americanos (OEA) e tem como principal objetivo oferecer cooperação técnica em projetos com o governo federal e estaduais. Atualmente, estão em desenvolvimento 22 projetos no Brasil.

Sobre a realidade brasileira, o diretor-geral comenta que mesmo em um cenário de crise, o país não pode se esquecer dos pequenos agricultores, dos agricultores familiares. “A agricultura tenta, em nível mundial, gerar avanços por escala e, muitas vezes, se esquece dos agricultores familiares”, afirma.

No Brasil, a agricultura familiar é responsável por 70% dos alimentos que chegam à mesa da população, com destaque para produtos como a mandioca, o feijão, milho e café. São mais de 4 milhões de estabelecimentos familiares no país que, juntos, respondem por 38% do Produto Interno Bruto Agropecuário, o equivalente a R$ 54 bilhões por ano.

A seguir, os principais trechos da entrevista:

Agência Brasil: Como o senhor vê a situação econômica do Brasil e o impacto disso, principalmente para os pequenos produtores?

Manuel Otero: Eu gostava muito do mote do Ministério do Desenvolvimento Agrário [atual Secretaria Especial de Agricultura Familiar e do Desenvolvimento Agrário] de que a agricultura familiar era parte da solução e não do problema. É uma maneira otimista de tentar gerar oportunidades para o futuro da agricultura familiar. É um tema complicado e um problema universal. A agricultura tenta, em nível mundial, gerar avanços por escala e, muitas vezes, se esquece dos agricultores familiares. Eles têm que ser pensados como produtores de uma agricultura de nicho, bem especializada. Na União Europeia há boas experiências, por exemplo na França, com denominação de origem, produção certificada, que dão a essa produção uma identidade que os mercados pagam. Temos que avançar nessa direção.

Agência Brasil: Como equilibrar o incentivo ao agronegócio e também à agricultura familiar?

Manuel Otero: É o famoso modelo de agricultura dicotômica, que se apresenta em praticamente todos os países. O Brasil é caso de livro, porque é bem típico. Há o agronegócio que evolui e gera cada vez mais volumes de produção. Quando ao tema da agricultura familiar, é fundamental concentrar-se na temática com mais e melhores políticas, tentando fazer com que pelo menos aqueles agricultores familiares que estão próximos de se inserir nos processos produtivos sejam inseridos.

Agência Brasil: O senhor defende maior industrialização da agricultura, como seria isso na América Latina?

Manuel Otero: Isso é fundamental. Vamos considerar um exemplo, o valor da tonelada exportada pela Argentina é US$ 400. Já a Holanda está exportando a US$ 2,5 mil por tonelada. Isso significa que a Holanda gera mais valor agregado que a Argentina. Isso, muitas vezes, está relacionado ao fato de que um país como a Argentina está exportando muita matéria-prima e agregando pouco a essa produção primária. Temos que pensar na industrialização da agricultura. Quando falamos industrialização da agricultura, falamos em gerar mais valor para a produção primária, em pensar na produção de energia renovável, pensar em insumos para a indústria. Hoje, um produto como o milho ou o trigo gera milhares de alternativas de processamento e isso potencializa muito o comércio, gerando valor agregado.

Agência Brasil: Em relação a populações vulneráveis, como vê a questão das mulheres e dos jovens em áreas rurais?

Manuel Otero: É fundamental entender que o papel da mulher e da juventude são chave. Eles são os primeiros que saem das áreas rurais. As mulheres porque estão mais bem capacitadas que os homens e os jovens porque não encontram nas áreas rurais internet, divertimento. É fundamental voltar a gerar oportunidades para que esses jovens não saiam da zona rural e, sobretudo, para atrair nova geração de jovens. Quando pensamos as últimas gerações, tratores, na agricultura de precisão, nos drones. É necessário um novo perfil para essa revolução agropecuária. Precisamos desses jovens melhor capacitados.

Agência Brasil: Como um organismo internacional que congrega os países americanos, como o IICA, pode promover cooperação maior entre eles? Os modelos podem ser intercambiados?

Manuel Otero: Hoje todos os temas são de natureza compartilhada. Quando se pensa em defesa agropecuária, quando se analisa o mapa de pragas e enfermidade, normalmente elas são compartilhadas entre os países. Então, é muito melhor ter um grande projeto supranacional, com componentes nacionais [ajustados à realidade de cada país], do que muitos projetos nacionais. Uma coisa que eu queria enfatizar é a cooperação Sul-Sul. Cada país, independentemente do grau de desenvolvimento, tem boas práticas e experiências bem-sucedidas, e o IICA poderia integrar todas essas boas práticas e por à disposição dos países. Isso poderia acelerar o desenvolvimento agropecuário.

*A repórter viajou a convite do IICA