Projetado por Lina Bo Bardi, prédio do Masp completa 50 anos
O icônico prédio do Museu de Arte de São Paulo (Masp), que se impõe sobre a Avenida Paulista, completa hoje (7) 50 anos. A radicalidade do edifício modernista projetado por Lina Bo Bardi (1914-1992) se expressa na imponência do concreto suspenso por quatro grandes pilastras. A obra é um marco na história da arquitetura do século 20. A ousadia da arquiteta ítalo-brasileira deu forma ao famoso vão-livre de 74 metros quadrados que há cinco décadas é ponto de encontro para feiras, manifestações políticas, shows, tornando-se um espaço democrático da metrópole.
“Eu gosto de usar o termo varanda urbana, porque é uma varanda na escala da cidade”, aponta o arquiteto Marcelo Ferraz, que foi colaborador de Lina Bo Bardi. O prédio começou a ser construído em 1958 e foi entregue dez anos depois – em uma inauguração que contou com personalidades como a rainha da Inglaterra, Elizabeth II. “Esse é o lugar que o paulistano adotou para se representar, para representar a cidade. É um marco, não só um monumento, mas é um lugar onde as pessoas vêm para serem vistas, para protestar, para passear, o que é fundamental numa cidade deste tamanho”, avalia Ferraz.
Durante os primeiros anos, o Masp ocupou um espaço bem mais acanhado do que o atual, dividido em quatro andares de um prédio na Rua 7 de Abril. O endereço era sede dos Diários Associados, conglomerado de imprensa fundado pelo jornalista e mecenas Assis Chateaubriand, que foi o idealizador do museu fundado em 1947. Ele contou com a ajuda do crítico e jornalista italiano, Pietro Maria Bardi, marido de Lina. O Masp foi o primeiro museu moderno no país e é, hoje, o mais importante acervo de arte europeia do Hemisfério Sul. A coleção do museu reúne mais de 10 mil obras, abrangendo produção europeia, africana, asiática e das Américas.
Além da forma arquitetônica, Lina Bo Bardi também inovou na forma de expor ao utilizar cavaletes com vidro que deixam as obras em suspenso. “Eu falo em uma coreografia expositiva, porque não é uma cenografia, uma montagem, uma expografia, é uma coreografia em que o visitante participa da exposição”, destacou o arquiteto. As obras saíram da parede e foram dispostas no meio de um grande salão, aproximando-as do público. “É muito bonito ver as pessoas caminhando aqui e vendo outra pessoa lá na frente, mais na frente desaparece e depois aparece novamente”, descreveu.
Os cavaletes voltaram ao museu em 2015, após quase 20 anos sem que as obras fossem expostas dessa forma. Míriam Elwing, gerente de projetos de arquitetura e infraestrutura do Masp, explica que eles voltaram com a mesma proposta, mas com adaptações que permitem melhor conservação e manutenção das obras e do espaço. “Vários museus do mundo têm interesse de trabalhar com esse sistema expositivo. A gente já cedeu cavaletes para outras exposições. É um sistema bastante revolucionário e está intrinsecamente ligado à ideia de permeabilidade da própria arquitetura do Masp”, explicou Miriam.
No salão que fica no segundo andar, com largas janelas de vidro, uma novidade vem sendo planejada pela administração do Masp: a instalação de persianas automáticas para abertura no final da tarde. “É uma experiência incrível porque se consegue ver tanto de dentro pra fora, quanto de fora pra dentro, essa permeabilidade do prédio fica estabelecida, é muito bonito”, apontou a gerente. Hoje as persianas não permitem essa movimentação, pois são manuais. A experiência foi feita uma vez na comemoração dos 70 anos do museu.
Nesta quarta-feira (7), o museu ficará aberto até as 22h. A entrada será gratuita durante todo o dia. Às 18h, em comemoração, as persianas do segundo andar serão abertas.
Preservação
Em 2017, o Masp recebeu financiamento do Programa Keeping It Modern, da Fundação Getty, que é voltado para o desenvolvimento de pesquisas para a conservação de edifícios modernos no mundo. No museu brasileiro, a ideia era estabelecer um plano com diretrizes de conservação e manutenção permanente.
“A gente tem a notícia reconfortante que a estrutura está em bastante bom estado, é segura e vai permanecer desde que tenhamos ações de conservação adequadas, especialmente ligadas às vigas principais que sustentam o prédio e também ações para melhorar a resposta da laje do térreo à ocupação intensa, que é função das manifestações e usos das mais diversas naturezas”, apontou Míriam.
Um dos episódios conhecidos de uso do vão-livre foi o show da cantora baiana Daniela Mercury em 1992. Com um palco montado embaixo do prédio, ela teve de interromper o show por ter atraído muito mais gente do que o esperado e pelo temor das autoridades de que a estrutura pudesse ser abalada.
“A estrutura é projetada para se mexer, não é uma estrutura rígida, é móvel, mas tem que ter controle disso e ela não pode vibrar além de um certo índice porque isso poderia comprometer a estanqueidade da obra”, apontou Míriam. Ela explica que agora, com o programa de conservação, há mais conhecimento sobre o comportamento da estrutura e ações necessárias.
Curiosidades
Até 1989, as colunas vermelhas do Masp eram cinza, expondo todo o concreto. “Aí começou a ter infiltração e goteiras na pinacoteca. A viga é oca por dentro, então tinha infiltração de água da chuva pelas paredes”, relembrou Ferraz. A solução foi impermeabilizar as vigas. O arquiteto conta que foi a própria Lina Bo Bardi que propôs pintá-las de vermelho. “Ela falou que sempre quis que as vigas fossem dessa cor. A gente estranhou, achou que ela estava mentindo. Não é que ela vai buscar um desenho, um croqui antigo e mostra que ela realmente tinha pensado na viga vermelha”, contou o parceiro da arquiteta.
Ferraz refere-se ao Masp como uma espécie de “patinho feito” na Avenida Paulista. “Ele invade o recuo, ele avança um pouco na avenida, porque foi feito antes do alargamento, então está fora do alinhamento. É pequenininho, baixinho, quando comparado aos prédios que estão em volta. Por outro lado, é o espaço mais democrático da cidade de São Paulo”, diz.
*Com informações da repórter Sarah Quines, da TV Brasil