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Indicado brasileiro ao Oscar conta história de mulheres do século 20

Daniel Mello - Repórter da Agência Brasil
Publicado em 26/10/2019 - 17:56
São Paulo
O filme A Vida Invisível, do diretor Karim Aïnouz
© Divulgação/Bruno Machado

O filme A Vida Invisível, indicado brasileiro para disputar o Oscar, retrata toda uma geração de mulheres nascidas na primeira metade do século 20, disse o diretor do longa, Karim Aïnouz. Entre essas mulheres, está a própria mãe do diretor, que morreu poucos dias antes que ele lesse os originais ainda não publicados à época do romance A Vida Invisível de Eurídice Gusmão, de Martha Batalha.

Naquela ocasião, em 2015, Aïnouz conta que tinha escrito uma carta para parentes e amigos íntimos antes do velório de sua mãe. “Era muito importante que eu contasse pelo que ela passou, como ela conseguiu me criar sozinha, sendo o arrimo de família, o que ela tinha feito na trajetória profissional dela”, lembrou ao participar de um debate na sexta-feira (25) na 43ª Mostra Internacional de Cinema de São Paulo, no Itau Cultural.

Poucos dias depois, ao ler o livro enviado pela produtora que o havia convidado para dirigir a adaptação da obra para o cinema, Aïnouz disse que viu várias semelhanças entre as histórias. “De alguma maneira eu me senti contemplado quando eu li o manuscrito porque era muito do que eu tinha escrito sobre a trajetória da minha mãe, que faria 90 anos no mês de dezembro”, disse ao lembrar que sua mãe nasceu no mesmo ano da estrela do filme, Fernanda Montenegro (1929).

“O que eu tinha escrito sobre a minha [mãe] era um pouco o que a Marta escrevia sobre as mulheres da geração da minha mãe”, acrescentou.

O filme A Vida Invisível, do diretor Karim Aïnouz
Diretor Karim Aïnouz, do filme A Vida Invisível - Reuters/Direitos Reservados

Adaptação

Na sinopse, a história se passa no Rio de Janeiro dos anos 1950, quando Eurídice, com 18 anos, e Guida, com 20, são duas irmãs fortemente ligadas em um lar conservador. A primeira sonha em ser pianista e a outra em viver um grande amor. As duas acabam separadas pelo pai por quase toda a vida. O projeto para o filme começou em 2015, mas o livro só foi para as livrarias em 2016.

O pontapé inicial para que o livro que ainda não tinha sido publicado se tornasse uma grande produção cinematográfica veio da diretora-assistente Nina Kopko. À época, ela trabalhava na produtora responsável pela realização buscando histórias com potencial para se tornarem filmes. “Quando o li o livro, ele me tocou muito porque eu sinto desde que eu entrei na faculdade de cinema que eu tinha uma necessidade de buscar referenciais de mulheres, que é algo que a gente carece em diversas áreas”, disse.

Mesmo nas leituras iniciais, Kopko disse que já começava a ver a possibilidade de fazer uma das grandes alterações que foram feitas entre a obra escrita e a que foi para as telas: a substituição do tom de humor irônico pelo drama melodramático. “Aquilo me bateu muito forte, obviamente pensando na história da minha mãe, das minhas tias, da minha avó. Apesar de o livro ter um tom bastante irônico, ali eu vi um cheiro de melodrama”, disse.

A história das duas irmãs que se desencontram nos caminhos da vida acabou se tornando um texto base para a narrativa do filme. “O primeiro desafio do processo foi colocar o livro em ordem cronológica. Porque o livro tem muitos pulos que, em literatura, funcionam, mas que não necessariamente funcionariam em uma narrativa cinematográfica”, explicou o roteirista Murilo Hauser a respeito desse processo de construção.

Espírito das personagens

Mais do que transformar o romance em cenas, Hauser disse que se apropriou do espírito das personagens. “A Eurídice passa boa parte da vida tentando se expressar de formas diferentes. Ela costura, cozinha, quer publicar um livro de receitas. Ela tem várias tentativas que são proibidas. Ela nunca consegue fugir daquele âmbito da casa dela”, resume sobre os conflitos vividos pela protagonista.

“O que eu tentei foi ser fiel com relação aos personagens”, enfatiza o diretor ao explicar que as duas histórias acabam sendo mesmo muito diferentes. Ele assume, no entanto, que foi muito mais “cruel” com as vidas imaginadas no romance do que a autora.

Apesar de todas as alterações em relação ao livro, Aïnouz disse que se sentia confortável em ter um bom texto base para se apoiar para a construção do filme. “Era a sensação de ser um trapezista em um circo que tinha rede, que você podia cair porque tinha uma rede que te aparava ali”.

Exibições e prêmios

A Vida Invisível só será lançado comercialmente nos cinemas no próximo dia 21 de novembro. Entretanto, estão sendo feitas diversas pré-estreias em algumas capitais. Hoje (26), ele será exibido em Recife (PE), amanhã (27), em Teresina, e na segunda-feira (28), em Brasília.

Em maio, A Vida Invisível foi premiado na mostra Um certo olhar, que integra o prestigiado Festival de Cannes, na França.

A cerimônia do Oscar está agendada para o dia 9 de fevereiro. O anúncio dos filmes estrangeiros finalistas ao Oscar será no dia 13 de janeiro. A última vez que uma produção brasileira concorreu na categoria foi em 1999, com Central do Brasil, de Walter Salles. O filme contava com a participação da atriz Fernanda Montenegro, que concorreu ao Oscar de melhor atriz naquele ano.