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Chuvas alagam obras do metrô em área com sítio arqueológico em SP

Movimento que luta para preservar local pede medidas para conter danos
Daniel Mello – Repórter da Agência Brasil
Publicado em 06/03/2024 - 17:52
São Paulo
São Paulo (SP), 06/03/2024 - Desmoronamento de muro e parte da calçada da rua Paim arrasta carro para terreno das obras do metro 14 Bis, em Bela Vista.  Foto: Rovena Rosa/Agência Brasil
© Rovena Rosa/Agência Brasil

As fortes chuvas que atingiram especialmente a região central da capital paulista na terça-feira (5) alagaram o canteiro de obras da Estação Saracura/14 Bis da futura linha Laranja do Metrô. Na área que está sendo escavada, onde está atualmente o bairro do Bixiga, foi encontrado um sítio arqueológico que pode conter vestígios do Quilombo Saracura, que existiu no século 19.

O Movimento Mobiliza Saracura Vai-Vai, que luta pela preservação da história da população negra na região, informou ter solicitado medidas para conter os danos ao Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan). Segundo o movimento, além da inundação, o rompimento de um duto causou uma grande erosão que destruiu parte da calçada e arrastou dois carros na Rua Paim, onde está outra parte das obras do metrô e que fica a poucos metros do canteiro em que está o sítio arqueológico.

Em fevereiro do ano passado, o Iphan recomendou a interrupção dos trabalhos arqueológicos no local por causa do período de chuvas. Em seguida, o Iphan fez uma série de exigências à Linha Uni, concessionária responsável pelas obras do metrô. A empresa deveria apresentar documentos e laudos sobre as intervenções de segurança no canteiro. Assim, o resgate de peças no local só foi efetivamente retomado em julho.

Em novembro do ano passado, a Polícia Federal esteve no canteiro após uma vistoria identificar que os procedimentos ocorriam em desacordo com as determinações do Iphan.

Milhares de objetos

Entre julho e setembro do ano passado, foram retirados do local 7,1 mil itens diversos, como fragmentos de cerâmica e louça, pedaços de couro, vidro, dentes de animais, conchas e vestígios de tecido. De acordo com o relatório da A Lasca, empresa responsável pelos trabalhos arqueológicos, a maior parte do material parece ser do século 20.

Alguns objetos, entretanto, chamaram a atenção dos arqueólogos. Um deles é um cachimbo cerâmico com detalhes em alto-relevo que, segundo os pesquisadores, era “provavelmente de uso de populações afro-brasileiras em períodos históricos”. No dia 21 de fevereiro deste ano, foi retirada do local uma panela com cabo que, de acordo com o relatório arqueológico, pode ter sido usada para rituais.

Na ocasião, a empresa de arqueologia relatava dificuldades devido às chuvas. “Em decorrência das precipitações pluviais frequentes dos últimos dias, o solo se tornou instável”, diz um e-mail enviado pela empresa ao Iphan relatando dificuldades nos trabalhos de resgate. Segundo a mensagem, a orientação da equipe de segurança da obra era de que os pesquisadores não entrassem na área escavada até que o tempo melhorasse.

O sítio arqueológico foi identificado em abril de 2022, quando as obras da futura Estação Sracura/14 Bis já tinham sido iniciadas. As obras desalojaram a Escola de Samba Vai-Vai, que estava há 50 anos no local e foi fundada por descendentes do Quilombo Saracura.

A partir dos documentos de licenciamento ambiental, a reportagem da Agência Brasil mostrou que regiões do Bixiga e da Liberdade, também com história ligada à população negra da capital paulista, foram os únicos pontos do traçado da Linha Laranja em que não foram feitos estudos arqueológicos prévios. A concessionária Move São Paulo, à época responsável pelas obras, solicitou, em 2020, ao Iphan a dispensa de estudos nesses locais.

Atualmente, o movimento Saracura Vai-Vai pede a revisão do licenciamento para as obras. A forma como as autorizações foram concedidas também é investigada pelo Ministério Público Federal.

A reportagem da Agência Brasil entrou em contato com a Linha Uni e aguarda resposta. A concessionária responsável pelas obras da Linha Laranja do metrô tem o grupo espanhol Acciona como maior acionista, além do banco de investimentos Société Générale e o fundo Stoa, ambos franceses.