Argentinos declaram US$ 4,6 bilhões em plano de regularização de capital
Os argentinos já tiraram US$ 4,6 bilhões guardados no colchão (em casa ou cofres em bancos locais) e abriram contas bancárias para depositar o dinheiro até o dia 21. Esse foi o resultado da primeira parte do plano de regularização de capitais, batizado de branqueamento. Anunciado pelo governo do presidente Mauricio Macri, o plano permitirá a declaração de dinheiro escondido na Argentina ou no exterior mediante o pagamento de uma multa (entre 10% e 15% do total).
Na Argentina, além do Imposto de Renda, a Receita Federal cobra um imposto aos que tem mais de 305 mil pesos (R$ 65 mil) em “bens pessoais”. Esses bens, que precisam ser declarados anualmente, incluem desde imóveis e veículos a dinheiro - mesmo que não gerem renda adicional.
Quem tiver como único bem o apartamento onde mora há uma década, cujo valor é superior a R$ 65 mil, paga todos os anos 0,5% dessa soma, além do IPTU. Quem tiver bens pessoais superiores a 5 milhões de pesos (R$ 1 milhão) paga a alíquota máxima de 1,25%. O mesmo ocorre com carros, barcos e poupança – mesmo aquela que não está no banco rendendo juros.
Guardar no colchão
Há um ano, as autoridades calcularam que os argentinos tinham US$ 190 bilhões (40% do Produto Interno Bruto da época) não declarados – a maior parte no exterior. Mas, na Argentina, é hábito guardar a poupança fora do sistema financeiro – muitas vezes em casa.
Sucessivas crises financeiras levaram a população a desconfiar dos bancos – a última, em 2001, resultou no confisco das contas bancarias e à desvalorização da moeda.
No ano passado, antes de ser eleita vice-presidente de Mauricio Macri, Gabriela Michetti foi vítima de um roubo. Os ladrões que entraram na casa dela levaram, além de objetos de prata e pesos, US$ 50 mil que ela guardava no armário.
“O plano de branqueamento de capitais tem dado certo, se comparado com os últimos dois”, disse o economista Fausto Spotorno. “Já foram declarados US$ 4,6 bilhões mais do que entrou em 2009 [US$ 4,2 bilhões] e em 2013 [US$ 3,1 bilhões]. E ainda falta a repatriação dos capitais no exterior”, disse.
Incentivo
Segundo Spotorno, o governo do presidente Mauricio Macri ofereceu melhores incentivos para convencer a população a declarar o que tem guardado em casa e fora do país. No governo de Cristina Kirchner (2007-2015) havia maior intervenção do estado e regras menos claras.
Em 2013, por exemplo, estavam em vigor controles cambiais que limitavam a compra de dólares ao câmbio oficial. “Quem ia trazer dólares do exterior, para vendê-los ao câmbio oficial e comprar títulos do governo, quando conseguiria muito mais no mercado paralelo ou internacional?, ” diz Spotorno. “Nao permitiam manter os dólares no exterior ou na Argentina, parado ou investido de outra forma”.
Como incentivo, o governo de Cristina Kirchner oferecia uma anistia: quem aderisse ao plano podia trazer quanto quisesse, sem ter que explicar ao fisco como conseguiu tamanha riqueza. “O problema era que, uma vez que o dinheiro entrasse na Argentina, todos sabiam que daqui não podia mais sair”, disse Spotorno.
Mal assumiu, Macri suspendeu os controles cambiais do governo anterior, provocando um aumento do dólar oficial (que chegou aos níveis do paralelo). Não é obrigatório repatriar o dinheiro no exterior – mas ele precisa ser declarado. Quanto aos pesos e dólares, que os argentinos têm guardados em casa ou em cofres, esses precisam ser depositados em uma conta bancaria especial até o dia 31 de marco.
“Depois desse prazo, você pode tirar o dinheiro e investir como achar melhor ou guardar onde quiser”, disse a contadora Mônica Varsallona. “Mas até então o dinheiro está congelado na conta”.
Tanto Spotorno, quanto Varsallona dizem que mais pessoas estão aderindo a esse plano – não apenas por confiar mais em Macri, do que em Cristina. Um motivo que pesou foi o acordo internacional, que praticamente acaba com o segredo bancário em paraísos fiscais (como Suíça e o vizinho Uruguai).
Vários governos decidiram trocar informações sobre estrangeiros com contas ou ativos em seus países. O risco de ser descoberto e ter que pagar uma multa alta pelas contas não declaradas pesou na decisão de muitos argentinos de regularizar a sua situação perante o fisco.