Movimentos sociais fazem manifestação pela democracia em várias cidades
A Frente Nacional de Mobilização Povo sem Medo e o coletivo Ocupa Carnaval promovem desde o fim da tarde de hoje (24) o evento cultural Festival pela Democracia, na Cinelândia, centro do Rio de Janeiro. Entre os artistas, grupos e blocos de carnaval anunciados estão BNegão, Otto, Gregorio Duvivier, Tico Santa Cruz, Grupo Maracutaia, Unidos do Baque Virado, Sarau do Escritório, Nada Deve Parecer Impossível de Mudar, Forró de Rabeca, Comuna que Pariu, Primavera das Mulheres, Centro de Teatro do Oprimido, Poesia Viral, Manifesto dos Escritores, Mario Lago Filho e DJ Fukô, entre outros. As duas entidades deixaram claro que não apoiam o governo federal.
O clima é de festa e reúne centenas de pessoas em frente à Câmara de Vereadores. O ato deve ir até a meia-noite no palco principal cedido pela organização da Paixão de Cristo, evento religioso que ocorrerá no local na segunda-feira (28). Uma das frases gritadas pelos organizadores é: "Golpe nunca mais. Eu tô nas ruas por direitos sociais". A frente usa as hashtags #saídapelaesquerda, #contraoimpeachment e #pelademocracia e distribuiu um manifesto, em que propõe uma “saída pela esquerda”. Segundo seus integrantes, a solução proposta pela direita representaria um “aprofundamento dos ataques a direitos sociais e trabalhistas”.
“Por isso não temos disposição de ir às ruas em defesa deste governo. Mas também não ficaremos calados e acovardados ante as ameaças ao que temos de democracia no Brasil. O ataque não é somente contra o PT. É contra o que quer que seja de esquerda neste país. Querem aniquilar o movimento social. Querem impor um ambiente de intolerância e linchamento, onde não há espaço para o pensamento e a ação críticos”, diz o manifesto.
Integrante do Ocupa Carnaval, Manu da Cuíca disse que o ato artístico é uma forma de diálogo com a política. "Os problemas que se apresentam hoje não são de agora. São problemas que têm tudo a ver com o sistema capitalista que a gente tem que enfrentar, tem que superar”, disse. Para a ativista, o festival é uma forma de colocar isso adiante, dentro dessa conjuntura. “Nós somos absolutamente contra o impeachment, e afirmamos que a saída é pela esquerda, com todas as pautas que colocamos aqui: contra o ajuste fiscal, conta a presença do exército na favela, pela legalização do aborto. Enfim, uma série de pautas acumuladas pela esquerda em toda a sua história e que precisam urgentemente ser colocadas em prática".
A professora municipal Raquel Nascimento, integrando dos coletivos Magdalena Nastácia e Cor do Brasil, ambos de Teatro do Oprimido, participou de uma performance do gênero no meio do público. Em cena, atores, a maioria negros, questionam os caminhos que um possível golpe levaria o país.
"O teatro do oprimido pensa a arte como forma de militância, a gente está aqui hoje não só para manifestar, mas para fazer pensar os rumos dessa sociedade. A gente sabe que hoje a gente já vive estado de exceção, principalmente nas favelas. A gente que é preto sabe, eu já fui detida pela polícia. A gente pode, a qualquer momento, ser visto como suspeito. Mas a gente sabe que, com esse iminente golpe, tudo pode ser muito pior. Então a gente tira o questionamento para pensar junto, mas a gente sabe que nó seremos um dos setores mais afetados".
O cientista social Yuri Rafael Freire da Silva afirma que há um golpe em marcha e, por isso, é preciso ir às ruas e "dar a cara a tapa". "Eu, como uma pessoa de esquerda, que defende um processo democrático, que defende o resultado de uma eleição presidencial, que foi feita de forma amplamente democrática, não posso cruzar os braços e assistir a um impeachment, que seria nada mais do que um golpe branco, um golpe dado dentro da esfera institucional", afirmou.
Outras cidades como São Paulo, Fortaleza, Uberlândia e Brasília também ocorreram atos com o mesmo objetivo. Pela manhã, a Frente Povo sem Medo fez uma manifestação no shopping Rio Sul, em Botafogo.
Manifestação em Brasília
Em Brasília, cerca de 70 manifestantes, segundo a Polícia Militar, protestaram contra o impeachment da presidenta Dilma Rousseff caminhando por uma das principais vias do centro da capita federal. O grupo, formado pelo Movimento dos Trabalhadores Sem Teto (MTST) e a Frente Povo sem Medo, participou do ato, chamado de Em Defesa da Democracia e de uma Saída pela Esquerda.
Às 17h os manifestantes começaram a se concentrar em frente ao shopping Pátio Brasil, localizado a cerca de 3 quilômetros do Congresso Nacional. Perto das 19h, o grupo caminhou pela W3 Sul, em direção à W3 Norte, ocupando duas faixas da pista. Nesse momento, o trânsito ficou congestionado para os motoristas que seguiam no sentido Asa Norte.
A marcha seguiu escoltada pela Polícia Militar. Os manifestantes erguiam bandeiras e faixas, além de gritar palavras de ordem. Uma delas era “nossa luta é todo dia, não vai ter golpe vai ter democracia”. A marcha foi curta e os participantes tentaram entrar em outro shopping.
A segurança, no entanto, impediu a entrada do grupo. Alguns dos manifestantes se queixaram de terem sido barrados. Em seguida, foram em direção ao prédio da Rede Globo em Brasília, ao lado do shopping.
Os protestos contra o que chamam de “golpe”, além de ofensas à emissora, continuaram. A entrada da Rede Globo foi protegida por um efetivo de cerca de 30 policiais. Por volta das 20h, o grupo se dispersou, embarcou em três ônibus e deixou o local.
Manifestação em São Paulo
Em São Paulo, manifestantes saíram em passeata na noite de hoje (24) contra a tentativa de impeachment da presidenta Dilma Rousseff. O ato, que teve concentração no Largo da Batata, zona oeste da capital paulista, foi organizado pela Frente Povo Sem Medo, que reúne diversos movimentos sociais. Com carros de som, bandeiras e camisas vermelhas, os militantes fecharam completamente um dos sentidos da Avenida Brigadeiro Faria Lima e Luís Carlos Berrini. O líder do Movimento dos Trabalhadores Sem Teto (MTST), Guilherme Boulos, ao discursar no início do protesto falou sobre a atual situação política do país.
“O que nós estamos vivendo hoje no país autenticamente uma tentativa de golpe, como ocorreu no Paraguai, em 2012, e em Honduras, em 2009. Um golpe que busca não só atacar liberdades democráticas, mas também os direitos sociais”, disse ao comparar o processo vivido por Dilma ao enfrentado pelo paraguaio Fernando Lugo e o hondurenho Manuel Zelaya, ambos destituídos da Presidência.
Boulos enfatizou, no entanto, que a manifestação não era uma defesa do governo, mas, sim, contra o golpe e em favor da manutenção dos direitos sociais. “Nós não estamos aqui para defende governo nenhum”, ressaltou. “Não estamos aqui para defender ajuste fiscal, que o povo pague a conta da crise e reformas que vão atuar contra os direitos dos trabalhadores”, acrescentou.
A diarista Jeane Campos (35 anos) levou o filho Iudi, de seis anos, porque acredita que o governo Dilma trouxe melhorias ao país. “Ela ajudou muito nos negócios do trabalho, da escola para as crianças, na saúde”, disse. Ela teme que a situação piore com a saída da presidenta. “Acho que a gente perde muita coisa”, disse a militante do MTST, que veio de Embu das Artes, na Grande São Paulo, para participar do ato.
O medo de retrocessos também foi o que motivou a estudante Iolanda Frutoso (19 anos) a ir ao protesto. “A direita que está tentando tomar o poder sempre nos explorou, pisou em nós. Eu acredito que nós temos que lutar pelos nossos direitos sociais, pelas nossas conquistas”, disse, citando como exemplo os programas de financiamento para o ensino superior.
Nesse contexto de disputa política, Iolanda acha que os meios de comunicação têm tentado influenciar a opinião pública em favor da destituição de Dilma. “A mídia dá um foco maio nessa questão de tirar o PT, para as pessoas acreditarem no impeachment”, destacou.
Impeachment
O presidente do PT, Rui Falcão, disse acreditar que o processo de impeachment contra a presidenta não será aprovado pelo Congresso. “Eu estou confiante de que não haverá impeachment. Não há base legal para o impeachment. A tese das pedaladas [fiscais] já foi praticamente derrotada”, disse em entrevista.
Falcão também defendeu a nomeação do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva como ministro da Casa Civil. A indicação foi suspensa por uma decisão do ministroGilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal. O mérito da questão ainda precisa ser analisado pelo plenário da Corte. “Não há nenhuma razão para obstruir uma medida que é de cunho exclusivamente administrativo, que é prerrogativa da presidenta. O Lula é ficha limpa, não há nenhuma razão para ele não ser ministro”.