Picciani nega propinas e diz não ter relação próxima a Sérgio Cabral
O ex-presidente da Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro (Alerj), Jorge Picciani (MDB), negou hoje (9) ter recebido propinas de empresários de transporte e da construção civil. Ele também afirmou não ter uma relação próxima ao ex-governador fluminense Sérgio Cabral (MDB). As declarações foram prestadas durante depoimento ao Tribunal Regional Federal da 2ª Região (TRF2).
O interrogatório, que durou mais de três horas, ocorreu dentro de processo resultante da Operação Cadeia Velha, um dos desdobramentos da Operação Lava Jato no Rio de Janeiro. Picciani é réu na ação, assim como os deputados estaduais Paulo Melo (MDB) e Edson Albertassi (MDB). Os três respondem por corrupção passiva, participação em organização criminosa e lavagem de dinheiro. O processo tramita na 2ª instância devido à prerrogativa de foro dos parlamentares.
De acordo com a acusação formulada pelo Ministério Público Federal (MPF), os deputados teriam recebido propina para garantir a aprovação de medidas legislativas em favor de empresas dos setores de construção civil e transporte público. Entre os crimes descritos, está o recebimento de propinas superiores a R$ 130 milhões para favorecer os interesses da Federação das Empresas de Transportes de Passageiros do Estado do Rio de Janeiro (Fetranspor).
Picciani negou ter recebido qualquer tipo de propina e disse não ter relação com Carlos Miranda. Também refutou as acusações do MPF. "Não há um ato de ofício meu que possa ser apontado como compra de apoio". O deputado disse conhecer apenas de nome Jacob Barata, empresário do setor de transportes acusado de envolvimento no pagamento de propina.
O ex-presidente da Alerj afirmou ainda que todos os recursos recebidos de empresas da construção civil durante as campanhas eleitorais foram declaradas, não tendo caixa dois em suas candidaturas. Garantiu também não possuir conta bancária no exterior. "Só tenho duas contas aqui, ambas com mais de 30 anos".
Depoentes
O deputado criticou as declarações prestadas pelos depoentes ouvidos hoje pela manhã na condição de delatores. Um deles é Carlos Miranda, apontado como operador financeiro de Sérgio Cabral, que disse ter existido uma ajuda mensal de R$ 400 mil pagos à Picciani pelo ex-governador. Ele também afirmou ter transferido mesadas de R$ 700 mil a R$ 900 mil para Paulo Melo.
Já o ex-presidente do Tribunal de Contas do Estado do Rio de Janeiro (TCE-RJ), Jonas Lopes Júnior, disse que Picciani e Cabral tinham relação de amizade e nada era feito no estado sem o consentimento do ex-presidente da Alerj . O jurista fechou acordo de colaboração premiada após ser denunciado pelo MPF de receber propina para ter "boa vontade" em processos de interesse de empresários do transporte e da construção civil.
Picciani listou divergências políticas que já teve com Cabral dentro do MDB. Ele disse ter apoiado Marcelo Itagiba para a prefeitura do Rio de Janeiro em 2008, quando o ex-governador articulou a candidatura de Eduardo Paes. O deputado afirmou ainda que, quando foi candidato ao Senado em 2010, Cabral não se empenhou em sua campanha e foi mais atuante em favor da eleição de Lindbergh Farias (PT). "Isso tudo é público. Onde está essa unha e carne?", questionou.
Gado
Jonas Lopes também afirmou em seu depoimento pela manhã que comprou gado da Agrobilara, empresa de Picciani, e usou dinheiro ilícito obtido em esquema no TCE-RJ para quitar a transação. A negociação teria sido uma forma de simular uma origem para os recursos. Ele teria pago R$ 600 mil pelos animais, mas R$ 500 mil foram por fora, sem a emissão de notas fiscais.
Picciani reconheceu ter emitido nota abaixo do valor da transação a pedido de Jonas Lopes e disse ter sido um ato equivocado. Ele, no entanto, negou saber que o dinheiro era decorrente de propina. "Como poderia saber a origem? Não tive nenhuma vantagem". Ele admitiu ainda ter recebido R$ 400 mil em espécie.
Prisões
Picciani, Melo e Albetassi foram presos pela primeira vez em novembro do ano passado, quando foram alvos de mandados de prisão preventiva no âmbito da Operação Cadeia Velha. Na ocasião, a Justiça Federal também determinou o afastamento dos três deputados de suas funções legislativas. Os parlamentares obtiveram a liberdade após decisões conflitantes da Alerj e do Judiciário. No entanto, foram novamente presos por determinação do Supremo Tribunal Federal (STF) e encaminhados à Cadeia Pública José Frederico Marques.
Em abril, Picciani obteve autorização para cumprir prisão domiciliar. Os outros dois parlamentares continuam presos no Complexo Penintenciário de Gericinó, em Bangu, no Rio de Janeiro. Embora estejam afastados do mandato, eles continuam recebendo os salários. Em nota, a Alerj informa que isso ocorre porque os três continuam na titularidade dos mandatos, pois o afastamento se deu por decisão judicial, tratando-se de "um caso atípico não previsto no Regimento Interno e nem na Constituição Estadual".