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Cultura

Carta de Mario de Andrade fala sobre sua orientação sexual

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Nanna Pôssa (colaboração: Felipe Rangel)
19/06/2015 - 14:37
Rio de Janeiro

Sonora: "Manu, recebi a carta. Está tudo certo. Apenas não vejo o que a minha chamada por você de "delicadeza moral" possa prejudicar uma integridade absoluta de amizade entre nós dois."

 

É assim que começa a carta secreta que o escritor Mario de Andrade endereçou no dia 7 de abril de 1928 ao amigo Manoel Bandeira. Seria mais uma carta de Mario de Andrade entre 15 mil se não fosse uma antiga polêmica. Um trecho do documento foi cortado por Manoel Bandeira no livro que publicou em 1958 com escritos do autor de Macunaíma.

 

O mistério do texto somente foi desvendado nesta quinta-feira, quando após uma decisão da Controladoria-Geral da União, a Fundação Casa de Rui Barbosa, que guarda o documento, liberou a consulta do documento datilografado de quatro páginas.

 

Sonora: "Está claro que nunca falei a você sobre o que se fala de mim e não desminto. Mas em que se podia juntar em grandeza ou melhoria para nós ambos, para você ou para mim, comentarmos, e eu elucidar você sobre a minha tão falada pelos outros homossexualidade? Em nada. Não adiantava nada para mim, porque em toda a vida tenho duas vidas: a social e a particular. Na particular isso só me interessa a mim, e na social, você não conseguia evitar a socialisão absolutamente desprezível numa verdade inicial"

 

No documento, o trecho em que o autor modernista deixava claro que não comentaria sobre a tão falada homossexualidade está riscado de caneta vermelha. Outra alteração é que o nome de Oswald de Andrade, em outros trechos do documento foi substituído por um X, respeitando um pedido do autor da carta.

 

Sonora: "Se você quiser guardar esta carta, risque, mas de maneira ilegível o nome que vai nela."

 

O estudioso da obra de Mario de Andrade, Eduardo Jardim, diz que a carta não traz nenhuma grande revelação.

 

Sonora: "A obra do Mario de Andrade, ela é atravessada de sensualidade, de carga erótica na poesia dele, ele sempre se pôs muito na sua própria obra. A literatura de ficção dele  - contos - são denúncias que ele está fazendo da hipocrisia, da moral hipócrita da época, com relação ao comportamento sexual das mulheres, dos homens, inclusive dos homens homossexuais."

 

A carta somente foi disponibilizada após um pedido feito através da lei de acesso a informação. A presidenta da Fundação Casa de Rui Barbosa, Lia Calabre, quer realizar um seminário para discutir o tema.

 

Sonora: "Nós vamos ter que pensar em novas normativas para o recebimento, para a guarda de documentos privados e de instituições públicas porque, sob o risco de não poder ter documentos sigilosos, a pedido dos herdeiros, nós também colocamos a memória em risco."

 

A Fundação Casa de Rui Barbosa vai fazer uma revisão do conjunto dos acervos para saber quais os documentos ainda inéditos e inacessíveis.

 

Sonora: "Tchau. Lembrança para o pessoal daí e um abraço do Mario de Andrade."

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