Na Trilha da História: Pesquisador revela detalhes sobre as piores secas do Ceará
*Esta é a última reprise de julho do programa. Semana que vem, as publicações inéditas voltam. Acompanhe nesta reprise a edição originalmente publicada em 28 de junho deste ano.
Olá! Eu sou a Isabela Azevedo e está começando o Na Trilha da História! Hoje, nós vamos falar sobre as secas mais severas que atingiram o Ceará. Quem conversa com a gente é o historiador Cicinato Ferreira, autor de vários livros relacionados à história do estado. Desde o século XVII, registros oficiais apontam períodos críticos de estiagem no território cearense.
Sonora: "O primeiro registro de grande seca na nossa história é de 1603, no tempo da colonização. Tivemos grandes secas em 1745, 1777, 1793, 1825, 1845... A maior delas, que passou para a história como a maior delas em termos de números catastróficos foi a de 1877 a 1879, considerada como a seca dos mil dias".
Foi durante a seca dos mil dias que os cearenses começaram a deixar o estado em busca de melhores condições de vida. O historiador lembra que essa estiagem ocorreu durante o período do Império, quando Dom Pedro II ocupava o trono.
Sonora: "Ele chegou a dizer que venderia a última joia da coroa para resgatar o Nordestino, mas isso ficou apenas como uma figura de retórica, não teve nenhuma iniciativa de valor para resgatar esse povo. Por isso que a gente entende que essa foi a pior seca que houve na nossa região."
Já a seca de 1915, que entristeceu as páginas do romance O Quinze, de Rachel de Queiroz, contabilizou pelo menos 30 mil mortes. Naquele ano, choveu cerca de um quarto do total do ano anterior. Trinta mil pessoas deixaram o Ceará rumo ao Norte e 11 mil em direção ao Sudeste e ao Sul do país. Além dos números impactantes, a seca do 15 ainda trouxe outra cicatriz para o povo cearense: a abertura de um campo de concentração.
Sonora? "O Campo de concentração foi criado mais ou menos em setembro de 15 e ele tinha apenas um objetivo: era isolar os retirantes que foram a Fortaleza aos borbotões mesmo. A partir de agosto, a seca muito brutal expulsou os sertanejos e aqueles que não puderam migrar tiveram que ficar isolados porque eles foram para o Passeio Público, um lugar muito frequentado pela sociedade cearense, e isso era algo que profanava".
O Campo de Concentração citado pelo historiador Cicinato Ferreira não se parecia aos conhecidos campos nazistas de trabalhos forçados.
Sonora: "Não havia uma prisão em termos clássicos. Ou seja, não havia o impedimento de deslocamento daquela pessoa que estava no campo para outro local. Realmente a gente não pode imputar ao governo cearense essa mácula. Mas a gente pode imputar ao governo o isolamento. Essas pessoas, apesar de não serem presas, não passarem por violência, ela tinham uma grande violência contra elas, que era a falta de assistência. Com a exceção de uma visita ou outra da igreja, uma visita ou outra de um médico, não tinha assistência".
Um lugar de tristeza e de morte.
Sonora: "Não foi de surpresa nenhuma que esse campo foi considerado Campo de Morte. Era para isolar as pessoas e deixar lá ao Deus dará. No campo teve uma mortalidade muito grande. Pra você ter uma ideia, o campo teve cerca de 3 mil mortes. Ou seja, uma mortalidade brutal!"
Com tantas dificuldades em combater a seca, houve quem sugerisse despovoar estados do Nordeste.
Sonora: "Eu sempre gosto de lembrar que, durante o século XIX, na seca de 1877 arrebatadora já até tomava conta dos debates da corte imperial, um dos propositores dizia que era preciso despovoar o Nordeste, despovoar o Ceará, a Paraíba e o Pernambuco porque não havia como morar em locais assim. Era preciso tirar todo mundo de lá para resolver a situação."
Mas mesmo que a previsão do tempo seja implacável com os cearenses, o amor à terra é ainda mais forte.
Sonora: "Só o vínculo cultural, a questão do hábito, a permanência DE certas crenças é que explica essa persistência. A gente tem que ver o amor das pessoas à terra, a questão do amor das pessoas aos seus locais. É difícil entender essa luta incessante do sertanejo para permanecer nas suas terras".
Esta foi a versão reduzida do Na Trilha da História! O programa completo tem uma hora e traz a entrevista na íntegra do historiador Cicinato Ferreira, além de músicas relacionadas à secas do Ceará! Para ouvir, acesse radios.ebc.com.br/natrilhadahistoria. Se você tiver alguma sugestão para o programa envie um e-mail para culturaearte@ebc.com.br. Até semana que vem, pessoal!
Na Trilha da História: Apresenta temas da história do Brasil e do mundo de forma descontraída, privilegiando a participação de pesquisadores e testemunhas de importantes acontecimentos. Os episódios são marcados por curiosidades raramente ensinadas em sala de aula. É publicado semanalmente. Acesse aqui as edições anteriores.