Morreu nessa quinta-feira, em Taboão da Serra, na grande São Paulo, a escritora Tula Pilar, conhecida como uma Carolina de Jesus da poesia. Tula Pilar sempre gostou de escrever. Um hábito que não costumava agradar os patrões quando era empregada doméstica. Ela falou sobre isso para a série documental Empoderadas:
Sonora: "Aí ela leu assim e falou: quem, escreveu isso? Eu disse foi eu. Aí ela como assim? Quem te ensinou. Eu falei: ué, eu escrevi. Aí ela ficou assim com uma raiva ela falou assim: você não veio aqui pra ficar escrevendo, aí pegou e rasgou, picou no chão assim, e pisou no tapete, pisou e falou agora vai lá pegar a vassoura e varre e cata. Eu falei ah, tá bom."
Menina negra, nascida em Leopoldina, interior de Minas, crescida em uma favela de Belo Horizonte, começou a trabalhar em casa de família aos sete. Com 15 teve sua primeira filha. Foi como doméstica que chegou em São Paulo, com 19 anos, e foi em Taboão da Serra, cidade na periferia da capital paulista, quando já estava na casa dos 30, que descobriu os saraus poéticos. Essa memória ela deixou registrada no Museu da Pessoa.
Sonora: "Eu passava e via assim o povo reunido no microfone e eu chegava meio tímida e pensei que a mulher era professora, um dia eu queria ir nesse microfone."
E quando resolveu pegar no microfone, sua história saiu em rimas.
Sonora: "Eu escrevi uma poesia que eu falo como eu vim para São Paulo, aí tenho um filho beiçudinho, com dificuldade tô para criar e a minha filha mais velha, a Samanta, moça vai ficar. Vou rimando assim, aí eu leio e as pessoas gostam e eu fico meu será que vão bater palmas pra mim? Todo mundo gostou muito e eu falei nossa."
Depois não parou mais. Virou referência, organizou e participou de saraus, comandou vários no centro da capital paulista e se viu no espelho ao descobrir Carolina de Jesus.
Sonora: "Se tem gente com fome, dá de comer. Se tem gente com fome, dá de comer. Carolina. Carolina Maria de Jesus, Carolinam a comida minha filha. Vem aqui Carolina catadora. Favela do Canindé, 1956. Carolina Maria de Jesus. Tula Pilar, favela alto do mineiro Belo Horizonte Minas Gerais, 1980."
De favela, empregada doméstica, mãe solteira, moradora de rua, Tula virou poeta das quebradas. Não gostava de favela. Mas tinha orgulho da periferia. Dizia que toda negra escritora é Carolina. A menina da favela do Alto do Mineiro rompeu as amarras da língua e publicou o livro “Palavras Inacadêmicas”. Dizia que as palavras eram seu troféu e, os aplausos, sua paga.
Sonora: "Sou a garota ousada, o meu cabelo é crespo, a minha pele muito negra. Tem que ser corajosa, persistente e abusada. Carolinas e Dandaras pra ser uma garota ousada... Sempre vou ser ousada, sempre vou ter 29 anos para sempre."
Tula morreu nessa quinta-feira aos 49 anos. Segundo a família, ela não se sentiu bem, chegou a ser levada para o pronto socorro em Taboão da Serra, mas teve uma parada cardíaca. Deixou três filhos, entre eles Samantha Pilar, que também participa de saraus como rapper.
Os filhos pedem ajuda para custear o funeral e a família continua morando em Taboão da Serra. Na periferia.