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Direitos Humanos

No Brasil mulheres, como Eunice Paiva, buscam por seus entes queridos

Mulheres unidas na dor pelo luto incompleto e na luta por justiça
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Sayonara Moreno - Repórter da Rádio Nacional
08/03/2025 - 09:56
Brasília
Brasília - A Comissão de Anistia, em parceria com a Comissão Especial de Mortos e Desaparecidos Políticos, abre as sessões de trabalho de 2016 (Wilson Dias/Agência Brasil)
© Wilson Dias/Agência Brasil

Enquanto o mundo assiste ao filme Ainda Estou Aqui e conhece a história de Eunice Paiva – que lutou pela verdade sobre o desaparecimento do marido Rubens Paiva, durante a ditadura militar no Brasil - é preciso dar luz à história de outras “Eunices” pelo Brasil e pela América Latina.  

Mulheres – da luta ou de fora dela – que assumiram a missão de descobrir o que aconteceu com filhos, maridos, pais e irmãos nos chamados “anos de chumbo”. Entre 1971 e 1973, o marido, o pai e o irmão da professora Victória Grabois, desapareceram, na Guerrilha do Araguaia, movimento armado de resistência contra a repressão. Hoje, aos 81 anos, Victória conta que, desde então, a ditadura não a deixou mais chorar, já que eles nunca mais foram encontrados.  

Enquanto Eunice Paiva buscava respostas sobre o sumiço do marido, Rubens Paiva, em 1971, Victória Grabois vivia na clandestinidade, com nome fictício, e já sem marido para compartilhar a criação do filho de quatro anos. A busca pela verdade e pelo fim da violência do Estado foram o combustível para que Victória Grabois se juntasse a outras mulheres que também queriam respostas. Em 1985 ela foi uma das fundadoras do grupo Tortura Nunca Mais, um dos movimentos com mulheres que passaram a se unir com o mesmo propósito.  

Outra integrante do Tortura Nunca Mais é a advogada Altair Vasconcelos, de 68 anos. A ditadura também desapareceu com o irmão dela, Joel Vasconcelos. A mãe de Altair e de Joel, a baiana Elza Santos, foi outra mulher obstinada na busca pelos restos mortais do filho, porque já guardava no coração a certeza de que ele havia sido assassinado pelos militares, em 1971, no Rio de Janeiro.  

Aos 81 nos, Diva Santana, é representante dos familiares na Comissão Especial sobre Mortos e Desaparecidos Políticos. A irmã dela, Dina Santana, também foi morta pelos militares na Guerrilha do Araguaia. Inspirada na história de mulheres como Eunice Paiva, Diva faz questão de prestar homenagem à força de todas as mães, esposas, filhas e irmãs que deixaram, segundo ela, um legado.  

São histórias de mulheres que soltaram a voz por justiça. Assim como Clarice Herzog, viúva do jornalista Vladimir Herzog, preso, torturado e assassinado na prisão, em 1975. A Coordenadora Executiva de Memória, Verdade e Justiça do Instituto Vladimir Herzog, Lorrane Rodrigues, chama de “estratégia das que ficam”, a forma como as mulheres passam a lidar com a perda de familiares desaparecidos na ditadura ou em outros contextos de violência do Estado, até mesmo em outros países.  

Mulheres que se uniram na dor pelo luto incompleto. Pela saudade de quem foi levado e não voltou, pela falta de um corpo para velar, de respostas e de ver a justiça sendo feita. Em 2014, a Comissão Nacional da Verdade confirmou, no relatório final, a morte e o desaparecimento de 434 pessoas vítimas da ditadura civil-militar no país. No entanto, entidades e pesquisadores acreditam que os números chegam a milhares de mortos pelo regime. 

*Com a colaboração de Luís Cláudio Ferreira e sonoplastia de Jailton Sodré, da Rádio Nacional em Brasília, Sayonara Moreno 

 

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