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Memória e Verdade #2: a conspiração que derrubou João Goulart

Em 1964, João Goulart é deposto e deixa o Brasil após golpe militar
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Gésio Passos - repórter da Rádio Nacional
02/04/2024 - 21:51
Brasília
Em 13 de março de 1964, o presidente João Goulart defendeu as reformas de base propostas por seu governo em um grande comício na Central do Brasil, no Rio de Janeiro. Foto: Arquivo Nacional
© Arquivo Nacional

“Eu estaria faltando um dever de confiança se não dissesse que esse esforço extraordinário que realizamos, ao lado do sofrimento também extraordinário que passa o povo brasileiros, (...) jamais atingirá os seus grandes objetivos sem que se realize no Brasil as reformas de base”.

Central do Brasil, Rio de Janeiro, 13 de março de 1964. O presidente João Goulart discursou em defesa das reformas de base para mais de 200 mil pessoas.

A agenda de desenvolvimento do país colocava Jango em confronto com grupos conservadores. Uma crise econômica desafiava o governo, mesmo que mantendo grande apoio popular.

O cenário da Guerra Fria influenciava a disputa política brasileira. Após o discurso na Central do Brasil, movimentos conservadores convocaram a Marcha da Família com Deus pela Liberdade.

Juremir Machado da Silva, professor da PUC do Rio Grande do Sul e biógrafo de Jango, fala também da importância da imprensa na construção do golpe. "Todos os grandes jornais da época, o Globo, Correio da Manhã, Jornal do Brasil, Estadão, todos apoiaram o golpe com base na ideia de que o Jango era incompetente, era fraco, era incapaz de governar e, principalmente, que ele estaria flertando com o comunismo. O estopim disso tudo foi o comício na Central do Brasil quando o Jango assume que vai fazer reformas, como a reforma agrária". 

No final daquele março de 1964, Jango discursou em um ato de marinheiros que queriam melhores condições de trabalho e direitos civis.

A ruptura institucional estava próxima. Até que o general Olímpio Mourão chegou com seus tanques em 1º de abril de 1964, no Rio de Janeiro, vindo de Juiz de Fora. Foi a consumação do golpe planejado há muito tempo por militares, empresários e norte-americanos.

Dois porta-aviões, um porta-helicóptero e embarcações de apoio da segunda frota dos Estados Unidos já estavam a caminho da costa brasileira para apoiar os golpistas contra uma possível resistência legalista, a chamada operação Brother Sam.

Para o jornalista e ex-preso político Franklin Martins, os Estados Unidos impulsionaram o golpe militar no Brasil. "A direita não era maioria, os conservadores não eram maioria, mas eles usaram as forças armadas, e as forças armadas entraram nesse jogo em boa medida por causa do impulso que os EUA deram para tentar impedir um procedimento de um processo democrático dentro do Brasil. Então, eu esperava que fosse haver uma resistência e não houve, porque o famoso dispositivo militar constitucionalista do Jango não saiu em campo".

Com apoio do Congresso Nacional, o golpe se institucionalizou na madrugada de 2 de abril. O cargo de presidente foi declarado vago, mesmo com João Goulart ainda no país.

O deputado Ranieri Mazilli é empossado como presidente interino, com os políticos oposicionistas tentando assumir o controle do golpe.

Mas os militares não aceitaram devolver o poder. Um comando golpista, formado pelo general Costa e Silva, almirante Rademaker e o Brigadeiro Correia tomaram o país.

O primeiro Ato Institucional desse comando convocou o Congresso para eleger um presidente com amplos poderes: o general Castelo Branco.

Biógrafo de Jango, Juremir Machado da Silva avalia que o ex-presidente preservou o país de uma guerra civil. "Por que eu vejo o Jango como herói? Duas vezes Jango teria possibilidade de jogar o Brasil em guerra civil: em 1961, quando da legalidade, muitos queriam que ele resistisse pela força para assumir como presidente num regime presidencialista. E em 1964, a mesma coisa. Ele poderia ter ficado no Brasil, poderia ter resistido ao golpe militarmente, e seria um banho de sangue".

Mas, isolado e traído, Jango não buscou resistir e decidiu se exilar no Uruguai.

A série Memória e Verdade busca resgatar os 60 anos de golpe de Estado no país. Nesta quarta-feira (3), vamos falar sobre a repressão e os crimes da ditadura militar.

*Com sonoplastia de Jailton Sodré. 

Confira todos os episódios da série

#1 Renúncia de Jânio abriu portas para ruptura

Jânio Quadros renuncia a presidência em agosto de 1961, abrindo uma crise na república. Militares tentam impedir a posse do vice-presidente, João Goulart. Uma manobra no Congresso cria o sistema parlamentarismo, derrotado por um plebiscito em 1963. O golpe estava em gestação.

#2 A conspiração que derrubou João Goulart

Enquanto o ex-presidente João Goulart defendia reformas estruturais no país, militares planejavam o golpe de estado com apoio dos Estados Unidos. A ruptura foi efetivada com as tropas do general Olímpio Mourão chegando ao Rio de Janeiro em 1º de abril de 1964.

#3 A repressão e os crimes da ditadura

A tomada de poder pelos militares resultou em todo tipo de restrição civil e de violência. Políticos cassados, o Congresso fechado, novos ministros do STF indicados. Milhares de presos, torturados e mortos. Ditadores governam por atos institucionais autoritários.

#4 Resistência à ditadura e a luta pela democracia

Com os horrores da ditadura, a sociedade passa a exigir a volta da democracia. A esquerda se dividiu formando algumas organizações clandestinas que buscaram uma resistência armada. A democracia foi reconquistada apenas com a Constituição de 1988. Mesmo assim, a justiça nunca foi realizada.

#5 Legado da ditadura e transição democrática

Após 60 anos do golpe militar, a transição democrática continua incompleta no Brasil. Pesquisadores, professores, ativistas e ex-presos políticos falam sobre a lição da ditadura para a democracia atual brasileira.

Por dentro da série

A série Memória e Verdade resgata diferentes momentos dos 60 anos de golpe de Estado no país.

Reportagem Gésio Passos
Sonoplastia Jailton Sodré
Edição do especial Daniela Loguinho
Edição Radioagência e implementação web Leyberson Pedrosa
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