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Ex-delegado diz à CNV que desconhecia Casa da Morte de Petrópolis

Akemi Nitahara – Repórter da Agência Brasil
Publicado em 29/07/2014 - 20:54
Rio de Janeiro

Em depoimento à Comissão Nacional da Verdade (CNV), na tarde de hoje (29), o ex-delegado Mauro Magalhães, que atuava em Petrópolis, em 1971 - época em que vários presos políticos foram mortos no imóvel que ficou conhecido como Casa da Morte, na cidade da região serrana do Rio de Janeiro - disse que não sabia da existência do centro de tortura clandestino.

“Não confirmo nada, nunca ouvi falar, até hoje não sei onde fica. Essa casa existiu antes, durante ou depois da minha estada em Petrópolis?”, questionou. Ao ver uma foto da casa, o ex-delegado também negou que tenha estado no local, no bairro Caxambu.

Magalhães admitiu que o coronel Paulo Malhães, que confessou à CNV ter atuado na Casa da Morte, esteve “quatro ou cinco vezes” na sua delegacia, mas nega ter conhecimento sobre a atuação dele na cidade. “Logicamente, se existia algum esquema do Exército lá, eles não iam me revelar. O Malhães ia com dois sargentos lá [à delegacia], mas não falavam nada sobre isso, não iam me revelar nada nunca”.

Malhães foi morto em um assalto ao sítio dele, no dia 25 de abril, um mês após prestar o depoimento à CNV. De acordo com o membro da CNV José Carlos Dias, vários depoimentos e documentos apontam o delegado Magalhães como tendo relacionamento com os militares envolvidos com a Casa da Morte.

“Não se pode admitir que ele tendo sido delegado de Petrópolis, naquele período em que a Casa da Morte estava fabricando as suas vítimas, que ele não tivesse nenhuma notícia a respeito desses fatos. Ele está sendo desmentido por um número grande de pessoas que mencionam ele e que existia a Casa da Morte. Há vários fatos. Neste momento, nossos assessores estão mostrando documentos a ele, em que ele é desmentido de vários fatos que ele negou”.

Após o depoimento com a presença da imprensa, Magalhães foi conduzido para uma reunião particular com a CNV, onde foram apresentados os documentos que comprovam o envolvimento dele com os militares em Petrópolis, apesar de o delegado não ser apontado como participante do esquema nem acusado de encaminhar presos para o centro de tortura.

Mas Dias lembra que, na época, em Petrópolis, ao menos seis pessoas tiveram como causa da morte atropelamento, mas sem que houvesse inquérito sobre os acidentes. “Isso pode ser uma forma de acobertar as mortes do centro de tortura”, diz o advogado.

Também prestou depoimento o empresário Humberto Costa Pinto, que se apresentou espontaneamente e falou de forma reservada. De acordo com o membro da CNV José Paulo Cavalcante, Costa Pinto apontou corrupção envolvendo órgãos e agentes da repressão que causaram prejuízo à empresa da família dele e também à União.

“É comum a repetição do mito de que os militares não tiveram envolvimento econômico, não quiseram enriquecer, mas o caso de Costa Pinto mostra que houve envolvimento da comunidade de informação e de pessoas que enriqueceram no exercício de atividades econômicas, por causa do poder que vinha da comunidade da informação [Sistema Nacional de Informação-SNI]. Um depoimento ilustrado com documentos, por fatos, os argumentos são irrespondíveis”, segundo Cavalcante.

Costa Pinto relata que a extinta autarquia Instituto do Açúcar e do Álcool (IAA) tinha o monopólio da compra e venda do açúcar no país, e era administrada por civis. Em 1982, o coronel Confúcio Pamplona assume a presidência da empresa e suspende o contrato com a empresa Costa Pinto, vencedora da licitação para fornecer o produto por quatro anos.

“Está comprovado, está numa CPI, num parecer da Procuradoria da República da época. Houve um claro conluio entre os dirigentes do IAA para, ao retirar a nossa capacidade de continuar comercializando, o que era contratualmente assinado conosco, para entregar a essa empresa Mapa. Nós éramos uma empresa muito importante, eu era presidente da associação dos exportadores. A violência foi feita através de uma suposta dívida que jamais existiu, o Banco Comércio e Indústria de São Paulo, que não existe mais, iniciou uma cobrança indevida, em conluio com o IAA, com o fim específico e claro de cancelar o contrato que era de quatro anos. Depois de assinado, a Mapa mostrou que não tinha condições físicas para cumprir os contratos”, argumentou Costa Pinto.

Também estavam previstos para depor hoje, mas não compareceram e apresentaram atestados médicos: José Benedito Montenegro de Magalhães Cordeiro, que falaria sobre os desaparecimentos de Nego Fubá; Pedro Fazendeiro, integrante das ligas camponesas de Sapé (PB); o ex-capitão Ailton Guimarães Jorge, que atuou no Doi-Codi do Rio e na Vila Militar; e o ex-PM Riscala Corbage, que ficou à disposição do Doi-Codi do Rio.

O depoimento do juiz Nelson Machado Guimarães, que atuou na 2ª Auditoria da Justiça Militar Federal de São Paulo, foi remarcado para quinta-feira (31). Pela manhã, três militares foram ao Arquivo Nacional prestar depoimento, mas preferiram ficar calados.

Até sexta-feira (1º) estão previstos 20 depoimentos de agentes ligados à repressão. Está confirmada para amanhã (30) a oitiva do ex-comandante da Base Aérea do Galeão, Jorge José de Carvalho, que será ouvido em casa. Também foram convocados para depor amanhã Cláudio Almeida de Aguiar e Irio de Paula Bastos, ambos vinculado ao Cisa, serviço de inteligência da Aeronáutica.

Foram convocados, mas alegaram questões de saúde para não comparecer, o general Newton Cruz (caso Riocentro) e Ary Casaes Bezerra Cavalcanti, comandante da Base Aérea de Santa Cruz entre 1970 e 1972. Antônio da Motta Paes Júnior, comandante da Base Aérea do Galeão nos anos de 1973 e 1974, está viajando, segundo parentes.