Aposentados continuam na ativa enquanto STF não decide sobre desaposentação
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Aos 67 anos, Degenes Borges não pensa em parar de trabalhar. Mesmo depois de se aposentar, ela continua na ativa. O principal motivo é o salário. A renda dela mantém a casa onde mora com os dois filhos e uma neta. “O dinheiro não era suficiente para comprar os remédios, a comida e as coisas de casa. Como não era suficiente, tive que continuar trabalhando.”
Situação semelhante aconteceu com Paulo da Cunha. Depois de 32 anos de trabalho no setor de combustíveis, ele decidiu voltar ao trabalho e permanecer na área em que atuava. “Meu planejamento previa me aposentar e logo continuar a trabalhar para não ficar obsoleto para o mercado”, disse. “Você não pode se sentir inútil. Uma solução é ser uma pessoa que contribui com a sociedade [trabalhando]”, completou.
Mas outros fatores também pesaram. A renda de Paulo diminuiu em relação ao que ganhava, mas gastos como a saúde, por exemplo, se mantiveram. “Quanto mais idoso, mais caro é o nosso gasto, porque aumentam as despesas com remédios, e muitos devem ser tomados sem interrupção, pelo resto da vida”.
Segundo dados da Advocacia-Geral da União (AGU), Paulo e Degenes fazem parte de um grupo de aproximadamente 480 mil aposentados que voltaram a trabalhar. O advogado especialista em direito previdenciário Humberto Tommasi explica que, ao voltar para atividade, a pessoa volta a contribuir para a Previdência Social.
Até 1994, existia o benefício do pecúlio, que devolvia ao segurado o valor que foi contribuído. “Hoje você contribui para um fundo que não é para a sua conta individual. É para a coletividade. Aquilo que você está pagando hoje está financiando quem está aposentado hoje”, explica o economista do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) Marcelo Caetano.
Pelas regras atuais, quem se aposenta pela segunda vez troca o benefício já adquirido por um segundo, que na maioria das vezes é mais vantajoso, já que o tempo de contribuição é maior. Tomasi explicou que, quando a pessoa se aposenta – por tempo de contribuição, idade ou especial – ou permanece na ativa contribuindo para a Previdência Social, pode trocar o valor do benefício. Acrescentou que ao fazer isso, será levado em conta o tempo posterior da aposentadoria o que lhe renderá um benefício melhor.
Mas não existe uma lei que regulamente a desaposentação. Assim, quem pretende fazer a troca precisa entrar na Justiça. “Necessariamente é preciso buscar o Judiciário. Como administração pública, o INSS está limitado aos ditames da lei. Não pode fugir do que diz a lei e não existe lei prevendo esse tipo de troca de benefícios”.
O também advogado da área e professor universitário Sérgio Henrique Salvador lembra que, em 2013, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) julgou um caso sobre o tema e definiu que os valores já recebidos pelo segurado não precisavam ser devolvidos. “Em 2013, o STJ confirmou a desaposentação. Confirmou o direito que o trabalhador tem de que nada tem que ser devolvido”.
O debate sobre o tema é antigo. Em 2003, um caso do Rio Grande do Sul chegou ao Supremo Tribunal Federal (STF). No fim do ano passado, o processo voltou ao plenário do Supremo, mas a votação está suspensa, porque a ministra Rosa Weber apresentou um pedido de vista para analisar o caso.
Os ministros decidirão sobre a possibilidade ou não da desaposentação para os beneficiários. Outro recurso extraordinário de 2011, de Santa Catarina, também foi levado ao plenário da Suprema Corte e a decisão foi suspensa. já que três ministros não estavam presentes na sessão. A opinião dos ministros está dividida.
Neste último processo, a AGU defendeu que a Previdência tem caráter contributivo e solidário e que esses aspectos precisam ser observados. Outro ponto levantado pela AGU é o aumento do custo para o Instituto Nacional de Seguro Social (INSS). Com o crescimento de pedidos, a Justiça contabiliza 123 mil processos em andamento. Para o órgão, a estimativa é que nos próximos 20 anos o impacto financeiro, caso o STF vote a favor da desaposentação, chegue a R$ 70 bilhões.
O assunto divide opiniões também de especialistas. Para Tomasi, o aposentado que volta a contribuir merece a contrapartida de um benefício melhor. “Na verdade, quando é feito o cálculo, quando uma aposentadoria é pensada, ela é calculada para que o indivíduo, no momento da aposentadoria deixe o mercado de trabalho e nunca mais volte a pagar contribuições previdenciárias”. Tomasi ressalta que, mesmo aposentado, o beneficiário continua pagando ao INSS.
Enquanto a decisão final não é tomada pelo STF, Degenes só pensa em não ficar parada. “Para me aposentar eu vou esperar chegar aos 70 anos de idade. E só porque nessa idade a pessoa tem que sair na marra.”