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Prevenção de HIV/Aids precisa dialogar com a juventude, dizem especialistas

Akemi Nitahara – Repórter da Agência Brasil
Publicado em 02/12/2016 - 22:48
Rio de Janeiro

As campanhas de conscientização e prevenção de HIV/Aids precisam ser renovadas constantemente para dialogar com a juventude. O tema foi debatido hoje (2) no I Encontro Carioca de Discussão das Políticas Públicas sobre Prevenção de HIV/Aids para a Juventude, organizado pela organização não governamental (ONG) Centro Integrado de Estudo e Programas de Desenvolvimento Sustentável (Cieds), na Universidade Veiga de Almeida, no Rio de Janeiro.

A gerente de Inclusão e Bem-Estar do Cieds, Aldeli Carmo, explica que, segundo dados do Ministério da Saúde, a infecção entre jovens de 15 a 24 anos aumentou 40% de 2002 a 2014, principalmente no segmento de homens que fazem sexo com homens (HSH). De acordo com ela, houve uma banalização do HIV/Aids, que agora é vista como doença crônica.

Ela disse que como tem sido vista a questão do tratamento, da medicação, acaba tornando simples algo que ainda é muito complexo. Segundo Aldeli Carmo, não existe aquele medo de morrer. A Aids é vista como qualquer outra doença crônica, e o jovem não se apercebe da condição real. Ela acrescentou, contudo, que o HIV/Aids é muito diferente de uma diabetes, uma hipertensão; "a Aids tem uma carga de medicação muito pesada, que tem outros efeitos. Não tem a mesma linha de tratamento e não deixa o paciente nas mesmas condições que outras doenças crônicas”.

Diálogo constante

Outra expositora, a diretora executiva do Centro de Promoção da Saúde (Cedap), Kátia Edmundo, enfatizou a importância do diálogo direto e constante com o jovem, para que ele se envolva na discussão e descubra formas mais eficientes de adquirir e compartilhar informações sobre o tema.

É fundamental, no seu entender, que mais pessoas se envolvam no desenvolvimeto de espaços de discussão com a juventude, para que os agentes de saúde possam ampliar informações a respeito da prevenção e gerar condições para que os jovens possam refletir sobre a própria realidade e encontrar suas próprias formas de se prevenir.

“Como é um tempo histórico relativamente pequeno, de 35 anos, embora a gente já tenha avançado, a discussão não pode deixar de ser aquecid. Ela não pode ficar esperando o Dia Mundial de Luta contra a Aids, ou o carnaval, para as ações acontecerem. Precisa construir uma agenda de discussão da prevenção. Não adianta falar 'faça assim ou faça assado'. Hoje tem um conjunto de tecnologias de prevenção, cada um tem que gerenciar os próprios riscos e fazer as próprias escolhas”, afirmou Kátia Edmundo.

Entre os temas debatidos no encontro está a necessidade de combinação dos métodos de prevenção. Além do preservativo, destacam-se a profilaxia pós-exposição (PEP), com o uso de medicamentos antiretrovirais por pessoa não infectada após o contato sexual desprotegido; a TasP, sigla em inglês para Treatment as prevention, que consiste em testar e tratar imediatamente após o diagnóstico; e profilaxia pré-exposição (PrEP), quando a pessoa não infectada mas com potencial de alto risco utiliza o antirretroviral preventivamente.

Um dos coordenadores da Rede Estadual de Adolescentes e Jovens que Vivem com HIV/Aids no Rio de Janeiro, Reinaldo Ribeiro, mostrou sua pesquisa de graduação em biologia, na qual levantou dados entre os jovens soropositivos para verificar se a educação sexual recebida pode ter influenciado na infecção. Entre os resultados, ele adverte que, se em 1989 a maioria dos soropositivos tinham apenas o ensino fundamental, em 2016 a “cara da Aids mudou", aumentando muito entre os graduados.

Reinaldo disse que comparando desde 1989, tem um gap de dados de 1996 a 2016, e lança aluns questionamentos para descobrir o que aconteceu nesse período? Quais as mudanças que aconteceram? O que mudou que está aumentando a infecção? Foi a educação do jovem? Sua conscientização? Falta falar sobre sexualidade nas escolas?

Tem jovens, segundo ele, que nunca ouviram falar de PrEP e que não sabem sequer colocar uma camisinha. "Sabem que é importante, que precisa usar para não engravidar, mas não sabem como por  a camisinha. Então tem muita coisa, eu acho que ainda falta didática, um jeito certo de conversar com os jovens para falar sobre sexualidade”, acrescentou.

Projeto-piloto

Uma ação que pôs em prática esse diálogo foi o projeto Afirmando Vozes e Identidades, que ministrou oficinas no Complexo da Maré, zona norte do Rio,  em 2012 e 2013, para jovens gays negros, moradores de favela. Segundo Mauro Lima, do Grupo Arco-Íris, ao constatar que a contaminação estava aumentando, o grupo resolveu “falar com a galera para ver como eles estão fazendo sexo”. De acordo com ele, o uso do preservativo é visto como uma imposição desagregada das relações de maneira prazerosa. Portanto, não dialoga com a juventude.

“Então, essa forçação de barra que o preservativo tem implícita, faz a gente decidir não usar por uma série de motivos: porque eu amo o cara e quero sentir prazer com ele sim; porque estou muito drogado naquele momento; porque aquele cara é muito gostoso e eu não quero deixar ele escapar; porque o preservativo não está na minha gaveta ou na minha carteira no momento; ou poque eu tenho vergonha de ir no posto de saúde buscar, porque eu ainda sou adolescente. Mas eu vou transar de uma forma ou de outra”, explicou Mauro Lima.

Segundo ele, o trabalho começou com autoconhecimento, com questões como “o que é ser veado dentro da favela?”, “quais são as problemáticas que você vive dentro da sua casa?”, “o que te dá mais prazer?”, “você sai na rua para fazer pegação de que forma?”. A partir daí, cada um passa a entender onde estavam os riscos na própria vida, para depois traçar um plano de vida de gerenciamento desses riscos.

Na avaliação de Mauro, “a pessoa precisa ter consciência da sua dinâmica sexual, de como o seu corpo funciona, onde está localizado o seu prazer, e você poder usufruir desse prazer tendo consciência do seu risco e adotando outras práticas que podem, cada vez mais, diminuir sua vulnerabilidade. "O nome disso é gestão de risco. Então, fazer a prevenção hoje não é mais só falar sobre o uso de preservativo. Você precisa entender qual é o risco que você corre, onde você está na sociedade, no seu meio”, afirmou.

No encontro também foi exibido um vídeo para explicar novas metodologias de prevenção.