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Direitos Humanos

Movimento Negro vê apreensão de menores, sem flagrante, como apartheid

Estado e prefeitura do Rio de Janeiro defendem a medida
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Priscila Thereso* - repórter da Rádio Nacional
22/12/2023 - 16:11
Rio de Janeiro
Rio de Janeiro (RJ), 15/11/2023 – Cariocas e turistas lotam praia de Ipanema, na zona sul, em dia de forte calor no Rio de Janeiro. Foto: Tomaz Silva/Agência Brasil
© Tomaz Silva/Agência Brasil

A apreensão de menores para averiguação, medida prevista na Operação Verão na cidade do Rio de Janeiro, passa por uma disputa judicial. Enquanto instituições como Defensoria Pública e Ministério Público estaduais defendem e solicitam a proibição dessas apreensões sem flagrante ou ordem judicial, estado e prefeitura do Rio conseguiram uma decisão favorável do Tribunal de Justiça para que as intervenções sigam acontecendo.  

O Movimento Negro Unificado diz ser inaceitável que governantes promovam ações ilegais contra a juventude negra da cidade. E chama de “apartheid” a prática de impedir que determinado grupo frequente espaços públicos por critérios de cor de pele e classe social, como explica Adriana Martins, representante da direção estadual do Movimento.  

 “Se nós pegarmos, a periferia é de uma forma, a zona sul é organizada de uma outra forma, e quando o prefeito hoje fala, nessa coletiva, em segregar os menores, em retirar os menores de circulação, significa que eles estão apartando esses menores, de alguma forma, da sociedade. Então, por isso a gente se refere a apartheid, porque é uma separação. Uma separação social, separação econômica. E, principalmente, é uma separação racial”, aponta Adriana.       

A socióloga Carolina Grillo, coordenadora do Grupo de Estudos dos Novos Ilegalismos da Universidade Federal Fluminense, critica a ideia de prevenção defendida pelas autoridades do Rio. Para ela, existe uma incriminação preventiva de tipos sociais considerados potencialmente perigosos.  

“É muito comum crianças negras sendo expulsas de restaurantes, expulsas de shopping, expulsas de uma série de espaços privados nessas regiões mais abastadas da cidade, por atitudes racistas dos seguranças e demais funcionários de estabelecimentos. É muito comum que esse tipo de prática racista reproduzida pela população de modo geral, incutindo uma série de traumas. O que agrava é a polícia é quem tem o dever de proteger as crianças e adolescentes das atitudes racistas, que são atitudes criminosas”, pondera a socióloga.  

Um outro aspecto a ser considerado é o impacto psicológico nesses jovens. Para Adriana Martins, é difícil dimensionar como esse tipo de violência afeta cada adolescente, porque trabalha com a subjetividade de cada um. No entanto, ela afirma que de forma geral, há impacto na autoestima.  

 “Se a gente pegar, dentro da coletividade, a gente vê que isso vai impactar altamente na autoestima desses jovens, porque a maioria desses jovens já não tem muita coisa. Geralmente são jovens que estão passando necessidade, que não têm comida em casa. São jovens que os pais, na maioria das vezes, estão desempregados, ou estão em subempregos. Tem um ciclo dentro dessa situação: quando você chega pra esse jovem, que não está cometendo ato infracional, é o estado que está usurpando o direito de ir e vir desse adolescente”, denuncia Adriana.

Na quarta-feira (20), a Defensoria Pública do Rio solicitou ao Supremo Tribunal Federal que restabeleça a decisão da própria corte que proíbe a apreensão de menores sem flagrante de ato infracional.  

 

* Com colaboração de Rafael Cardoso  

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